Interrupção voluntária da gravidez
A interrupção voluntária da gravidez (ivg) diz respeito à decisão de pôr fim a uma gestação que ainda está no início. Esta decisão, por ter contornos emocionalmente sensíveis, requere bastantes cuidados durante o processo.
De acordo com Patrão, King e Almeida (2008) a ivg já se faz há muitos anos, em vários países, tendo-se tornado legal em Portugal a partir de 2007, quando foi aprovada pela Assembleia da República.
Para compreender o processo de mudança, Sereno, Leal e Maroco (2012) remetem para os anos 50 em que o papel da mulher era sobretudo no lar e de mãe, papel este que era mais importante do que todos os outros. Contudo, estes valores foram mudando a partir da década de 90 e a maternidade tornou-se opcional, pelo que a mulher passou a ter o direito de escolher (Sereno, Leal, & Maroco, 2012).
Assim, Sereno, Leal e Maroco (2012) levam em conta, no que diz respeito à possibilidade para escolher, a necessidade de fazer uma decisão bem pensada que começa pela capacidade de análise, por parte da gestante em relação ao seu real desejo, ou seja, se realmente quer ou não ser mãe, e, em caso de a resposta ser negativa, se está ou não disposta a pôr fim à gravidez não desejada, por meio da ivg.
Ao nível da investigação a ivg carece de informação suficiente no que concerne às consequências psicológicas, contudo, em geral, vários estudiosos afirmam a existência de Síndrome Pós-Aborto (SPA) como passível de trazer consequências psicológicas negativas do foro emocional, dependendo de cada situação (Patrão, King, & Almeida, 2008). No entanto, tendo em conta que as opiniões variam, temos de nos basear nas questões da pró-vida e pró aborto (pró-escolha) (Cosme, & Leal, 1998, cit in Patrão, King, & Almeida, 2008, p.1).
De acordo com Sereno, Leal e Maroco (2012) a ivg advém de uma gravidez não desejada, ou seja, sem projeto prévio, o que acarreta uma capacidade emocional muito bem definida para decidir entre a interrupção, ou ficar com a criança ou ainda, dar a mesma para adoção.
Habitualmente, as respostas psicológicas à ivg são mais positivas do que negativas embora haja relatos de tristeza, mágoa e angústia entre os registos, no entanto, verificam-se dados em que há quadros de stresse pós-traumático devido a estratégias de coping mal conseguidas, especialmente quando há histórico de traumas na infância (Patrão, King, & Almeida, 2008).
Vários autores de vários estudos relatam que a ivg acarreta maioritariamente consequências de risco psiquiátrico, mais do que a decisão de levar avante a gravidez e que, na maioria destes casos, há necessidade de acompanhamento psiquiátrico e perturbações mentais associadas, como quadro evolutivo (Patrão, King, & Almeida, 2008).
Por outro lado, em muitos casos, os estudos mostram que as consequências psicopatológicas de uma ivg são negativamente associadas à capacidade para não sentir frustração uma vez que as mulheres se focam nas questões do emprego, do salário e da educação que acabam por ter mais peso do que o aborto em si (Patrão, King, & Almeida, 2008).
É por esses motivos que a mulher se vê na necessidade de avaliar os pós e os contras de uma gravidez não planeada, o que remete para a necessidade de analisar a situação segundo valores e crenças, perdas e ganhos, principalmente individuais (personalidade e experiências anteriores), em relação às pessoas mais próximas (relações interpessoais) e sociais (lei e as suas condicionantes) etc (Sereno, Leal, & Maroco, 2012).
Nestes aspetos os autores focam, principalmente, motivos interpessoais, socioculturais, que dizem respeito à angustia originada pelas reações do meio onde se insere, e sociais além da ética, moral e motivos, como um conjunto de condições que ajudam a analisar toda a situação e tomada de decisão (Sereno, Leal, & Maroco, 2012).
Tendo em conta as conclusões contraditórias entre os vários estudos, é impossível fazer uma associação definitiva entre a ivg e a síndrome pós-traumática do aborto (SPTA) enquanto resposta emocional geral (Patrão, King, & Almeida, 2008).
Conclusão
A ivg acarreta um conjunto de fatores a analisar como o desejo ou não de ser mãe, as relações interpessoais e as possibilidades para criar e educar um filho. Cabe à mulher o equilíbrio emocional necessário para poder fazer uma análise adequada que lhe permita uma decisão responsável, embora, na maioria dos casos, seja necessário que a mesma tenha acompanhamento ao nível do foro mental.
References:
- Patrão, I., King, G., & Almeida, M. (2008). Interrupção Voluntária da Gravidez: Intervenção psicológica nas consultas prévia e de controlo. [em linha] SCIELO, scielo.mec.pt. Disponível em www.scielo.mec.pt/pdf/aps/v26n2/v26n2a15.pdf;
- Sereno, Sara, Leal, Isabel, & Maroco,João. Interrupção voluntária da gravidez: ajustamento psicológico no processo de decisão. Saúde Reprodutiva, Sexualidade e Sociedade SRSS [online]. 2012, nº1 [cited 2016-07-10]: pp.65-81. Disponível em revistas.apf.pt/index.php/srss/article/download/8/37.