Vibrio cholerae
Vibrio cholerae é a bactéria responsável pela cólera, uma doença causada pela ingestão de comida ou água contaminadas e que, nos casos mais graves, provoca uma desidratação profunda, podendo levar à morte se não for tratada.
Perspetiva histórica
O anatomista italiano Filippo Pacini observou pela primeira vez esta bactéria em amostras de fezes de doentes com cólera em 1854. No entanto, devido às crenças do momento, o seu trabalho foi ignorado durante muitos anos. Em 1883, Robert Koch, de viagem ao Egito para estudar a cólera, identifica a bactéria causadora da doença, o Vibrio cholerae.
Nomenclatura e identificação
A Vibrio cholerae é uma bactéria, pertencente à família Vibrionaceae. É um bacilo, encurvado em forma de vírgula, anaeróbio facultativo, asporogénico, Gram-negativo e que é capaz de ter um metabolismo respiratório e fermentativo. O Vibrio cholerae é oxidase positiva, reduz o nitrato e é movido por um único flagelo polar.
O Vibrio cholerae é classificado de acordo com os seus antigénios somáticos (antigénios O). A classificação organiza-se em serogrupos, existindo cerca de 200 serogrupos conhecidos. Até pouco tempo, pensava-se que o serogrupo O1 incluía todas as estirpes responsáveis pelas epidemias e pelos endemismos da Cólera. Os serogrupos não-O1 de Vibrio cholerae estão associados principalmente a casos esporádicos de diarreia e infeções extraintestinais. No entanto, em 1992, um grande surto parecido ao da cólera aconteceu no Bangladesh e na Índia e revelou ter sido causado por uma estirpe não-O1 de Vibrio cholerae. Este organismo não pertencia a nenhum dos 138 serogrupos O conhecidos na altura, tendo sido designado O139. Desde então, o Vibrio cholerae O139 persistiu como o segundo agente etiológico da cólera.
O serogrupo O1 organiza-se em três serotipos: Ogawa, Inaba e o Hikojima e dois biótipos, o clássico e o El Tor, com base nalgumas propriedades químicas e na susceptibilidade a bacteriófagos. O crescimento de Vibrio cholerae O1 é inibido pelo composto O/129 (2,4-diamino-6,7-diisopropylpteridina), mas revela, cada vez mais, uma resistência a este composto, normalmente associada à resistência à trimethoprimsulfathoxazole. Os Vibrio cholerae O139 isolados são resistentes a O/129.
Transmissão
O Vibrio cholerae é uma bactéria com elevada mobilidade, que possui exigências nutricionais modestas, sendo o Homem é o principal reservatório. A doença resulta da ingestão de água ou de alimentos contaminados e está relacionada com a má gestão do ambiente. A ausência ou escassez de água limpa, a falta de sistemas de saneamento e um meio, de um modo geral, pouco salubre, são os principais fatores da propagação da doença. As zonas de risco são geralmente subúrbios onde não existem infraestruturas de base, assim como campos de refugiados e de pessoas deslocadas, onde as condições mínimas de pureza da água e de salubridade não estão reunidas.
Patogenicidade
A infeção devida ao Vibrio cholerae ocorre quando água ou alimentos contaminados são ingeridos pelo organismo. Após a passagem através a barreira ácida do estômago, o vibrião coloniza o epitélio do intestino delgado através do fator de colonização do pili (TCP), entre outros. A enterotoxina colérica (CT) produzida pelos vibriões aderidos (e possivelmente outras toxinas) altera o transporte iónico nas células do epitélio intestinal. A posterior perda de água e de eletrólitos leva a uma diarreia severa e característica da cólera.
Mecanismos de virulência
A patogenicidade do Vibrio cholerae é um processo complexo e envolve vários genes que codificam fatores de virulência que o permitem chegar ao epitélio do intestino delgado, a colonizar este epitélio e a produzir a CT. No Vibrio cholerae, a maior parte dos genes de virulência necessários à patogenicidade existe em grupos. Incluem o elemento genético CTX, que é o genoma do bacteriófago lisogénico CTXΦ (CTXphi) que transporta os genes que codificam CT, e a ilha de patogenicidade TCP que transporta os genes do fator de colonização do pili, TCP.
Ecologia
O Vibrio cholerae faça parte da flora bacteriana normal presente nas áreas ribeirinhas e estuarinas, no entanto, as estirpes não patogénicas são mais frequentemente isoladas do ambiente do que as estirpes O1 e O139. Além disso, fora das áreas de epidemias e longe de área que possam ter sido contaminadas, as estirpes isoladas do ambiente revelam ser principalmente CT negativas.
Vários estudos ilustraram a capacidade do Vibrio cholerae associar-se a uma variedade de organismos aquáticos incluindo crustáceos, zooplâncton, fitoplâncton e algas, de modo a prolongar a sua sobrevivência no meio aquático.
References:
- Center for Disease Control and Prevention. (2014). Cholera – Vibrio cholerae infection. Available: http://www.cdc.gov/cholera/index.html. Last accessed 4th Jul 2016.
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