O Complexo de Cinderela está ligado à dependência psicológica e financeira vivida por várias mulheres em relação ao cônjugue. Baseado na história da Cinderela, este complexo perpetua na figura feminina a eterna “fada do lar”.
Bastos, Borda, Lustosa e Correa (2005) começam por fazer referência ao fato de as mulheres, durante muito tempo terem ficado restringidas ao cuidado do lar, sem lhes ser dada a possibilidade de procurar o conhecimento e o encarar de novos desafios.
Cassepp-Borges (2007) e Bastos, Borda, Lustosa e Correa (2005) referem-se ao Complexo de Cinderela como um desejo inconsciente por parte da mulher, de se manter dependente psicológica e financeiramente de alguém, sem procurar melhorar as suas competências criativas e intelectuais, acabando por se limitar a ficar aos cuidados do marido.
Este complexo levou muitas mulheres com grandes capacidades a ficarem aquém dos homens, no que diz respeito ao sucesso profissional porque mantiveram uma postura dependente e fracassada, se motivação para a responsabilidade, com medo de não se saírem bem (Cassepp-Borges, 2007).
“…Complexo de Cinderela, que ocorre quando há um sistema de desejos reprimidos, memórias e atitudes distorcidas que se iniciaram na infância, na crença da menina de que sempre haverá alguém para sustenta-la e protege-la.” (Bastos, Borda, Lustosa, & Correa, 2005).
Tendo em conta as desigualdades laborais que ainda hoje se mantêm presentes na sociedade, é possível que o Complexo de Cinderela seja um mecanismo de defesa adotado por estas mulheres para se adaptarem a essas desigualdades (Cassepp-Borges, 2007).
Habitualmente, estas mulheres procuram homens que se interessam apenas pela componente sexual da relação, uma vez que elas dedicam a maioria do seu próprio tempo a cuidar do outro (Cassepp-Borges, 2007).
Entre os anos 80 e os anos 90, verificou-se a realização d muitos casamentos baseados nesta dependência, além de situações em que, mesmo obtendo um curso superior, estas mulheres preferiram restringir-se ao casamento e dispensar a independência (Cassepp-Borges, 2007).
Muitos estudos que corroboram esta ideia, mostram como as mulheres, muitas vezes, se conformam em adotar uma vida muito abaixo das suas capacidades devido ao sentimento de inferioridade e insegurança construído ao longo da vida, mantendo a ideia da menina assustada (Bastos, Borda, Lustosa, & Correa, 2005).
Uma das consequências mais complicadas do Complexo de Cinderela é o esquecimento de que o comodismo acarreta a diminuição da autoestima e até mesmo da dignidade, porque a mulher nestas condições, é percebida como o “sexo frágil” já que os desafios encontrados na sociedade provocam insegurança, acabando por viver para tomar conta dos filhos (Cassepp-Borges, 2007).
Estas mulheres acabam por ficar inibidas de se afirmarem no mercado de trabalho e não conhecem o prazer da produtividade laboral já que o auge das suas auto realizações se dá com o casamento, chegando mesmo a interpretar o trabalho como fracasso (Bastos, Borda, Lustosa, & Correa, 2005).
Porquê Complexo de Cinderela?
A personagem fictícia da Cinderela era uma menina bela e cheia de virtudes, maltratada pela madrasta e pelas irmãs, que mesmo assim não sentia qualquer tipo de mágoa pelas mesmas, dando o exemplo através do seu comportamento exemplar (Cassepp-Borges, 2007). Algumas das características da personagem, são:
- Valorização do estatuto do parceiro;
- Ajuda de forças sobrenaturais para conquistar o príncipe;
- Ausência de vaidade, contudo, precisa de um vestido bonito para encantar o parceiro;
- A iniciativa parte do príncipe;
- O príncipe apaixona-se perdidamente à primeira vista;
- A Cinderela encontra a saída da clausura em que a madrasta e as irmãs a mantêm, através do casamento perfeito e não lutando para ultrapassar desafios.
(Cassepp-Borges, 2007).
Em vários casos de relação conjugal, o autor verifica que as pesquisas indicam precisamente que ainda hoje, apesar de o casal dividir tarefas domésticas e responsabilidades financeiras, ainda é mais comum que a maioria das tarefas domésticas é dirigida à mulher e o sustento real da família é dirigido ao homem (Cassepp-Borges, 2007).
Outra das características em que podemos encontrar um paralelismo com a história, é o fato de a aparência física ser muito mais vincada no caso da mulher do que no caso do homem e que também é este que deve tomar a iniciativa da aproximação, pelo que, em caso contrário, a mesma deve ser feita subtilmente (Cassepp-Borges, 2007).
A par disso, a sociedade continua a introduzir culturalmente, na educação das meninas, a procura do rapaz ideal (Cassepp-Borges, 2007).
Observados vários aspetos no que diz respeito à forma como a mulher se relaciona com o homem, verifica-se uma panóplia de características enraizadas culturalmente que nos dão a entender como a sociedade promove o Complexo de Cinderela (Cassepp-Borges, 2007).
Verifica-se que, em grande parte dos casos, as mulheres mantêm comportamentos como:
- Crença no sobrenatural para encontrar o parceiro ideal;
- Crença no amor à primeira vista;
- Preferência pela iniciativa por parte dos homens;
- Importância dada à aparência e à situação financeira dos homens;
- Crença no amor para a vida toda.
- (Cassepp-Borges, 2007).
Conclusão
De acordo com a revisão da literatura, verifica-se que o Complexo de Cinderela está enraizado na cultura de várias sociedades por consequência da desigualdade de oportunidades no que concerne ao género. O complexo em questão leva mulheres que muitas vezes poderiam ultrapassar grandes desafios a limitarem-se à dependência psicológica e financeira do marido, por lhes ser desde sempre transmitida a ideia do sexo frágil que precisa de cuidado constante, o que as faz acreditar que haverá sempre quem as proteja.
References:
- Bastos, D.F., Borda, M.C.S., Lustosa, M.A., & Correa, G. (2005). A MULHER E O COMPLEXO DE CONDERELA. Acedido a 2 de junho de 2016 em http://www.cepsi.psc.br/artigos/texto_artigos_complexo_cinderela.htm;
- Cassepp-Borges, V. (2007). Identificação dos adolescentes de hoje com a personalidade de cinderela. Identification of today’s adolescentes with the cinderella personage. [em linha] PEPSIC, Periódicos Eletrônicos em Psicologia. pepsic.bvsalud.org/scielo. Boletim de Psicologia v.57 n.127. Acedido a 2 de junho de 2016 em http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0006-59432007000200009.