“Era uma vez…” – avaliação psicológica
Este é um teste projectivo, desenvolvido pela Drª Teresa Fagulha, com orientações psicodinâmicas, que pressupõe o papel activo do psicólogo e a livre expressão verbal e não verbal da criança. A prova pretende avaliar as emoções e a forma como a criança as elabora, especificamente a ansiedade e o prazer.
Em que consiste a prova “Era uma vez…”?
“Era uma vez…” possui um complemento de histórias, apresentadas em formato de banda desenhada, para ser utilizado em crianças com idades compreendidas entre os 5 e os 11 anos. O objectivo da prova é a descrição do modo “como as crianças elaboram as emoções, essencialmente a ansiedade e o prazer” (Fagulha, 1997, p.10). Estas emoções são importantes no desenvolvimento da personalidade e na organização dos processos mentais e sua estruturação.
A administração da prova é individual e tem uma duração variável, entre 20 a 30 minutos, na qual, o psicólogo tem uma participação activa que lhe permite uma comunicação mais fácil, e maior partilha de experiências emocionais por parte da criança, uma vez que ela verbaliza as histórias e expressa comportamentos não verbais (Almeida et al, 2004).
Fundamentação histórica
“Era uma vez…” foi exposta como tese de doutoramento à Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Lisboa pela autora Teresa Fagulha no ano 1992. No ano seguinte esta prova foi editada e desde então é divulgada em congressos científicos, quer nacionais (várias investigações em Portugal) quer internacionais (numa tese de licenciatura na Universidade Liége na qual a população alvo foram crianças belgas. Richard Dana, professor em Portand State University, inseriu um capitulo acerca desta prova no seu livro “Handbook of Cross-cultural and Multicultural Personality Assessment.
Descrição da Prova “era uma vez…”
A concepção desta prova teve como objectivo criar uma situação lúdica, proporcionando uma forma simplificada de aceder a esse espaço transicional e facilitando a leitura dos significados nele expressos pelas crianças” (Fagulha, 1997, p.11). Segundo Winnicott (1953, cit in Fagulha, 1999) o conceito de espaço transicional propõe à criança uma área lúdica – criativa – onde as suas experiências emocionais, partilhadas com o psicólogo, possam ser elaboradas entre a fantasia e a realidade. “ O pedido do psicólogo consiste em que a criança dê desfecho, geralmente de modo verbal, a uma história incompleta que lhe é apresentada. Quando as crianças contam uma história “estão a revelar a raiz das suas dificuldades, através da projecção” (Schofield, 1978, p. 147 cit in Fagulha 1997, p. 11).
Assim cria-se uma situação organizada em que a partir de histórias incompletas acerca da vida de um personagem infantil (masculino ou feminino), a criança continuará verbalmente os episódios iniciados pelo psicólogo.
Apresentação do material
A prova “Era uma vez…” é constituída por sete cartões-estímulo (cada um com 3 cenas), um cartão de exemplificação e outro cartão, com apenas uma cena, que se destina a finalizar a prova. Para cada cartão estão disponíveis dez cenas: nove para a criança escolher apenas três, de forma a dar seguimento ao cartão-estímulo e uma última cena que tem como propósito a finalização da história. O primeiro cartão-estímulo é apenas um cartão exemplo. A criança aqui vai perceber como é que irá ocorrer a prova, mas já nesta etapa ela participa com a ajuda do psicólogo caso seja necessário, sem nunca, obviamente influenciar nas escolhas da criança.
A Doutora Teresa Fagulha achou relevante haver duas versões desta prova, uma versão masculina, para os rapazes e uma outra feminina para as raparigas, facilmente detectáveis com as cores cinza claro (versão masculina) e amarelo claro (versão feminina) ou então com a personagem principal, sendo um rapaz ou uma rapariga.
A prova dispõe de uma folha de registo das respostas da criança e uma folha para análise das respostas. “A interpretação tem como objectivo revelar a dinâmica da elaboração emocional e baseia-se, fundamentalmente, na categoria de cenas que a criança escolhe e na posição em que as coloca ao organizar a sequência da história.” (Fagulha, 1997)
No final da apresentação dos 7 cartões o psicólogo apresenta um cartão (com a palavra “Fim no verso”) com o protagonista da história (menino ou menina) e pergunta à criança se quer dar um nome ao protagonista e qual o nome. Se a criança indicar outro nome que não o dela própria pergunta-se a quem pertence esse nome. O psicólogo deverá também perguntar que história ela gostou mais, qual gostou menos e porquê. Por fim sugere-se à criança que conte uma história que poderia ter acontecido ao protagonista dos cartões, na qual se pretende que a criança invente essa mesma história.
Análise e Interpretação das respostas
Existe uma folha de registo de respostas que se utiliza durante a apresentação da prova à criança e pretende-se registar o tempo de latência, que não é mais do que o tempo ocorrido entre a disposição das cenas na mesa pelo psicólogo até que a criança coloque, na posição indicada, a primeira cena escolhida. Também se anotam as cenas escolhidas pela criança em cada cartão-estímulo, bem como qualquer troca feita pela criança, onde observamos o comportamento não verbal.
Conclusão
Segundo Fagulha (1999), o contar e ouvir histórias é natural e atractivo para as crianças.
As histórias tradicionais permitem às crianças o confronto não só com a realidade como também com a fantasia, ensinando-as a lidar com as emoções e os sentimentos.
“Era uma vez…” não depende da verbalização, facilitando o seu uso com crianças que tenham dificuldades ao nível verbal. Além disso a prova possibilita a percepção da capacidade de comunicação da criança. O facto de existirem as duas versões (masculina e feminina) permite a identificação da criança com o protagonista da história, verificando-se, ou não, o funcionamento adequado dela em vários contextos (com os pares, a família e a escola).
References:
- Almeida, L., S., Simões, M., R., Machado, C., & Gonçalves, M., M. (2004). “Era uma vez…” Avaliação Psicológica: Instrumentos Validados para a População Portuguesa, 2: 101-113;
- American Psychological Association (2001). Manual de Publicação (4ª ed). Artmed Editora: Porto Alegre;
- Fagulha, T. (1997). Era uma vez… Prova Projectiva para Crianças (2ªed.). Lisboa: Investigação e Publicações Psicológicas;
- Fagulha, T. (1999). Era uma vez… um menino com medo de morrer: Revista Portuguesa de Psicossomática:. Porto, Portugal, 1 (001): 89-100.