Doenças relacionadas com a conformação das proteínas

A maioria das proteínas presentes no organismo humano detém a capacidade de manter a sua conformação nativa. No entanto, algumas dessas proteínas tornam-se parcialmente desnaturadas devido à ação de chaperones moleculares ou pelo facto de sofrerem degradação proteolítica. Para além disso, cerca de 35 doenças humanas, muitas delas por vezes fatais, estão associadas com a deposição extracelular de proteínas em certos tecidos, sob a forma de agregados insolúveis, conhecido como amiloide (esta designação surgiu pela sua forma assemelhada ao amido). As principais doenças incluem a doença de Alzheimer (DA) e a doença de Parkinson, sendo que estas doenças neurodegenerativas atingem principalmente os idosos. Porém, outra das doenças são as encefalopatias espongiformes transmissíveis (EET), que fazem parte da família das doenças neurodegenerativas infeciosas que é propagada de forma mais comum. Para além destas, existe uma outa doença, amiloidose, que é causada pela deposição constante de uma proteína “mutada” em diversos órgãos, tais como, o coração, fígado e os rins. A deposição da amiloide interfere com a função celular normal, o que resulta na morte celular e eventual falha do órgão. Embora, os vários tipos de proteínas amiloidogénicas sejam independentes e as suas estruturas nativas tenham amplamente diferentes “dobras”, as suas formas de amiloide têm bastantes semelhanças estruturais: cada uma consiste numa matriz de fibrilas amiloides com diâmetro de aproximadamente 10 nanómetros (nm). Desta forma, estas proteínas têm duas conformações estáveis radicalmente diferentes: conformação nativa e conformação amiloide.

Assim, as principais doenças relacionadas com a conformação das proteínas são:

  • Doenças amiloides: Muitas proteínas amiloidogénicas são formas “mutadas” de proteínas que ocorrem de forma espontânea. Nestas incluem-se a lisozima (uma enzima que hidrolisa as paredes celulares das bactérias), que interfere na doença da amiloidose, a transtirretina, que é uma proteína do plasma sanguíneo que funciona como um transportador para a hormona da tiroide (tiroxina que é insolúvel em água), bem como o retinol que está presente na polineuropatia amiloidotica familiar, e o fibrinogénio (percursor da fibrina, que constitui a formação de coágulos sanguíneos) que está associado à amiloidose do fibrogénio. Contudo, a maioria destas doenças não apresentam sintomas (tornam-se sintomáticas) e aparecem entre a terceira e a sétima década de vida e normalmente progridem ao longo de 5 a 15 anos, terminando na morte do individuo.
  • Doença de Alzheimer: É uma condição neurodegenerativa que afeta aproximadamente 20 milhões de pessoas, principalmente idosos em todo o mundo (aproximadamente 10% das pessoas com idade superior a 65 anos e aproximadamente 50% das pessoas com mais de 85 anos), provocando a deterioração mental a um nível devastador e a eventual morte do individuo. Esta doença é caracterizada pela deposição abundante de placas amiloides no tecido cerebral. Além disso, muitos corpos celulares neuronais contêm quantidades anormais de fibrilas com 20 nm de diâmetro, conhecidos como “emaranhados neurofibrilares” (promovem o bloqueio das sinapses). As placas amiloides consistem principalmente em fibrilas amiloides de 40 a 42 resíduos do péptido, denominado de péptido Aβ (os “emaranhados” neurofibrilares, provêm da forma hiperfosforilada da proteína tau, normalmente associada aos microtúbulos). A sequência do gene que codifica o péptido Aβ revela que este é um segmento de uma proteína transmembranar de 770 resíduos, denominada por proteína percursora da amiloide (APP). A função normal da APP é ainda desconhecida, no entanto esta é clivada a partir de um processo de múltiplos passos através da ação fulcral de duas enzimas proteolíticas: a β e γ-secretase. O avanço da doença está diretamente interligado com a deposição contínua das placas β-amiloide, pelo menos, nas décadas posteriores à manifestação da patologia da DA. Porém, não existe atualmente, nenhum tratamento conhecido que “iniba” o progresso da doença de Alzheimer. Ainda assim, têm surgido várias estratégias terapêuticas, que incluem a diminuição da taxa de produção do péptido Aβ, através da administração de substâncias que inibem a ação da β e γ-secretase ou através da administração de agentes que interferem com a formação das fibrilas β-amiloide a partir da forma solúvel Aβ.
  • Doenças provocadas por priões: Algumas doenças infeciosas que afetam o sistema nervoso central dos mamíferos são originalmente classificados como sendo causado por “vírus lentos”, sendo que estes levam meses, anos ou mesmo décadas para se desenvolverem. Entre estas doenças está a “scrapie”, que é caracterizada por uma doença neurológica que se manifesta em ovinos e caprinos, a encefalopatia espongiforme bovina (BSE ou doença das vacas loucas) e “kuru” uma doença degenerativa do cérebro que ocorreu entre o povo Fore da Papua da Nova Guiné e que foi transmitida pelo ritual do canibalismo. No entanto, existe também uma doença humana, rara e progressiva, a doença de Creutzfeldt-Jakob (CJD), que aparentemente surge espontaneamente, com sintomas semelhantes aos do “Kuru”.

 

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References:

  • Buxbaum, J.N. and Tagoe, C.E., The genetics of amyloidoses, Rev. Med. 51, 543–569 (2000).
  • Chiti, F. and Dobson,C.M., Protein misfolding, functional amyloid, and human disease, Rev. Biochem. 75, 333–366 (2006).
  • Goedert, M. and Spillantini, M.G., A century of Alzheimer’s disease, Science 314, 777–781 (2006).
  • Booth, D.R., et al., Instability, unfolding and aggregation of human lysozyme variants underlying amyloid fibrillogenesis, Nature 385, 787–73 (1997).
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