Introdução
O samba é um dos géneros de música e dança mais representativos da cultura popular brasileira. Originário da Bahia, na zona nordeste do país, entre as comunidades de escravos negros, alastrou-se a outras partes do país, tendo-se desenvolvido sobretudo no início do século XX no Rio de Janeiro. Não obstante as várias tipologias (samba-canção, samba raíz, samba-exaltação etc.), a entoação ou declamação da letra é tradicionalmente acompanhada por instrumentos de percussão e cordas, em compasso 2/4 ou 4/4. Foi declarado património da humanidade pela Unesco em 2005.
As raízes africanas e europeias do samba
O samba tem as suas raízes musicais numa mistura dos ritmos africanos com géneros musicais europeus mas o seu desenvolvimento deve-se, sobetudo, a acontecimentos de ordem demográfica e social.
O género nasceu nas comunidades de escravos vindos de África mas o seu crescimento aconteceu paralelamente ao crescimento da população negra e mestiça no Rio de Janeiro, na altura capital do Brasil. Este fenómeno de migrações deveu-se a vários eventos: o declínio das fazendas de café no Vale do Paraíba, o fim das guerras do Paraguai (1870) e Canudos (1897), a grande seca no nordeste do país (1877-79) e, principalmente, a abolição da escravatura em 1888, que levou as pessoas a partirem em busca de trabalho e melhores condições de vida.
Por outro lado, a chegada da corte portuguesa ao Rio de Janeiro, em 1808, serviu a entrada de géneros de música europeus no país, por exemplo a polca, a mazurka ou o schottisch. Estas danças foram, claro, submetidas a um processo de adaptação de carácter nacionalista, sendo eventualmente fundidas pelos músicos populares às formas nativas de origem africana, conhecidas até então pelo nome de batuque. Deste modo, na década de 1870 nascem o tango brasileiro, o maxixe, e o choro ao mesmo tempo que a técnica de execução dos instrumentos ganhava um cariz brasileiro.
Desenvolvimento do género moderno
Se a origem do género remonta efectivamente ao século XVI, o início da história do samba como o conhecemos hoje tem uma data. Em 1917, foi gravado o primeiro samba brasileiro, «Pelo Telefone», pelo menos de acordo com os registos da Biblioteca Nacional. A sua autoria, reivindicada por Donga (Ernesto Santo) e Mauro de Almeida é, na verdade, algo polémica porque muitos afirmavam que esta tinha sido o resultado de uma criação colectiva dos músicos que se reuniam na casa da baiana Tia Ciata (as tias baianas eram senhoras negras, originárias da Bahia, que vivam no Rio de Janeiro no final do século XIX; ajudaram a fomentar tanto o género como a organização do Carnaval Brasileiro).
Não obstante, o dito samba urbano carioca começou aqui a ser difundido pelo país, adquirindo o seu lugar no mercado musical. Em 1929, com o samba já enraizado no cenário musical da época, surgiu a primeira escola de Samba, “Deixa Falar”, fundada pelos sambistas do bairro do Estácio de Sá. “A mesma “Pelo Telefone” veio por em evidencia que o carnaval merecia reportório próprio, daí o nascimento do um género próprio para escola de Samba, que até então não tinha um repertório especifico e a partir deste ponto o Samba ficará sempre associado ao carnaval, embora nem todos os tipos de Samba sejam carnavalescos” (Morais, 2015, p.17). Deste primeiro período destacam-se os sambistas Donga, Pixinguinha, Caninha, Careca e Sinhô.
A aceitação global do samba não aconteceu, contudo, de um momento para o outro. É necessário recordar que a década de 20 ficou marcada pela perseguição policial aos sambistas e músicas populares, que representavam a cultura antiga “em oposição ao processo de modernização da cidade do Rio de Janeiro no século XX, existia assim uma guerra entre moderno vs antigo, elite vs povo e erudito vs popular” (Morais, 2015, p.17). Depois, o género era regionalmente associado aos morros, conotados de modo preconceituoso com a alegada perigosidade das pessoas que os habitavam, os negros e mestiços. Para o desaparecimento deste estigma contribuíram, sem dúvida, a primeira escola de samba, acima referida, cujo exemplo foi seguido por Osvaldo Cruz, o aparecimento da rádios nos anos 30 e 40, que transportou o samba para outras partes e a gravação de muito repertório do género. Deste período destacam-se os nomes Lamartine, Braguinha, Noel Rosa e Carmen Miranda.
Na década de 1950, assistiu-se a um desinteresse pela música carnavalesca, o que possibilitou o desenvolvimento do choro e do samba-canção, numa época em que as mulheres começaram a ser uma presença cada vez mais assídua no universo sambístico. No entanto, pela mesma altura, o surgimento da bossa nova como nova forma de expressão musical levou a que o samba estivesse pouco activo, voltando a ganhar popularidade nos anos 60. Através de compositores como Chico Buarque, o samba foi revitalizado ao mesmo tempo que as temáticas políticas e sociais regressavam à agenda. Os nomes de Martinho da Vila e Zeca Pagodinho marcam este novo período ao tornarem-se os primeiros sambistas recordistas de vendas, ainda que o último viesse a tomar uma nova direcção, a do pagode (associado às festas) surgido nos anos 80. Nesta altura, ouvia-se a expressão “samba de raiz” para distinguir os sambistas conectados com a fórmula dos anos 30/40 daqueles que cederam ao pagode. Ainda assim, nos anos 90, o samba continuou a ramificar-se em direcções diversas, não exclusivas, aproximando-se do rock e de outros géneros.
Em 2005, o samba foi considerado património da humanidade. Pese o risco de generalização, pela própria história de desenvolvimento, pelo ritmo e sentimento, acaba por traduzir a essência do povo brasileiro, sendo, por isso, um dos símbolos maiores do país.
References:
História do Samba. Em http://www.sambando.com/historia-do-samba
Morais, J.E.S.A. (2015). Factores críticos de sucesso para músicos de samba na cidade do Rio de Janeiro: como penetrar neste mercado e agradar aos consumidores. Dissertação de mestrado, IPAM.