Reflexividade

O conceito de reflexividade apresenta-se como polissémico, mas neste vasto conjunto de sentidos destacam-se duas tendências principais.

Introdução

O conceito de reflexividade apresenta-se como polissémico, mas neste vasto conjunto de sentidos destacam-se duas tendências principais: em primeiro lugar, emprega-se o termo reflexividade na caracterização geral da vida social moderna; em segundo lugar, aplica-se o conceito especificamente na referência a certas tentativas das ciências sociais explicarem a vida social moderna. Contudo, não é transparente a forma como se cruzam as duas exposições, pelo que está ainda por escrever a história reflexiva do conceito.

Exposição

I

Um exemplo da primeira cunhagem do termo condiciona a discussão de Beck (1992) relativamente à modernidade reflexiva. Neste âmbito, a reflexividade refere-se à “nova arquitectura” das sociedade modernas, na medida em que a violência humana face ao meio ambiental começa a colher as consequências negativas dessa usurpação. Portanto, a suposta virtude da dominação humana da natureza encontra-se suspensa pelo questionamento. Adicionalmente, Beck sugere também que a transformação em causa conduz à expressão da reflexividade pessoal, uma vez que os membros das sociedades modernas maturas interrogam assim tanto os padrões de vida como os padrões sociais.

Porém, ausente no argumento de Beck está a atenção ao segundo sentido central do conceito de reflexividade, isto é: quais as consequências reflexivas das ideias avançadas por Beck? Será que a crescente reflexividade pessoal resulta igualmente em diferentes relatos derivados ou necessários das ciências sociais? Este segundo sentido da reflexividade conota-se à ideia de que as afirmações e argumentos perpetrados pelas ciências sociais, em determinado sentido, referem-se às próprias ciências sociais.

Classicamente, a segunda usagem da reflexividade associa-se a espécies de paradoxos filosóficos, sendo o caso mais conhecido o paradoxo do mentiroso: assim, a afirmação de que todos os cretenses são mentirosos, quando proferido por um cretense, gera condições verdadeiras e falsas ao mesmo tempo; se a afirmação é verdadeira, então é falsa; se é falsa, logo é verdadeira.

Não obstante a conotação negativa associada a tal aporia, a reflexividade por vezes encoraja o investigador a uma análise aperfeiçoada, pelo que se pode classificar a reflexividade como uma introspecção benigna, uma vez que os cientistas sociais são impelidos a reflectirem sobre as circunstâncias sociais da sua produção de conhecimento, seja em termos metodológicos correctivos, ou enquanto pertencentes a injunções gerais dirigidas a uma maior percepção do contexto social e político a que pertencem e operam.

II

Na discussão etnometodológica de Garfinkel (1967), o conceito de reflexividade implica a interdependência entre documentos ou relatos e as características do método interpretativo do documento: o sentido do primeiro é elaborado com recurso ao conhecimento do último, ao mesmo tempo que o sentido do último é um subproduto gerado pelo conhecimento do primeiro. Deste modo, a reflexividade constituidora  detém implicações radicais para as ciências sociais quanto ao argumento causal, posto que lança dúvidas consideráveis sobre  os elementos que compõem uma explicação.

Conclusão

Diz-se que a reflexividade é frequentemente engendrada pelas tendências relativizantes das ciências sociais: qualquer declaração sobre a influência das circunstâncias sociais respectivamente a situações particulares, pode ser compreendida como também referindo a própria declaração. Este aspecto particular da reflexividade surge como cerne particular no trabalho produzido no contexto da sociologia do conhecimento científico. Ao passo que foi convincentemente demonstrado que o conhecimento científico das ciências naturais é um produto de processos sociais, culturais, históricos e políticos, pouca atenção se consagrou ao facto de que as próprias ciências sociais são também geradas pelas mesmíssimas forças. Tal inconsistência resultou em críticas, nomeadamente por parte da filosofia objectiva da ciência.

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References:

Beck, U (1992) Risk Society: Towards a New Modernity, London.

Garfinkel, H. (1967) Studies in Ethnomethodology, Englewood Cliffs, NJ.

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