De um modo geral, nas ciências sociais há um consenso quanto à questão do género, considerando que em sentido lato, este conceito é utilizado para distinguir entre as categorias biológicas de feminino e masculino e as categorias socialmente construídas de homem e mulher (ou rapaz e rapariga). Ou seja, assume-se que o sexo representa a diferença biológica ao passo que o género define os comportamentos sociais considerados “normais e naturais” para cada sexo. Por conseguinte, o género varia acentuadamente no espaço, isto é, de sociedade para sociedade, e no tempo, quer dizer, no decurso da história humana. Portanto, a análise do género envolve o estudo das condutas normativas associadas a cada sexo, como as avaliações das masculinidades e feminilidades, e as condicionantes sociais através das quais cada sexo aprende essas mesmas condutas normativas.
Convencionalmente, as construções de género fixam o corpo masculino e feminino em tipos ideais, uma vez que há uma forte normatização quanto ao que deve ser a devida conduta de cada sexo. Assim sendo, cada elemento apresenta um leque de atitudes determinadas como “naturais”: é inerente ao homem a agressividade, individualidade e racionalidade, ao passo que a qualidade essencial da mulher é a passividade, a sensibilidade e gentileza. Mas esta gramática corporal denota uma problemática deveras complexa: o corpo enquanto facto social. Como estas diferenças referem as assimetrias criadas entre os sexos, os sociólogos assumem que as relações de dominação, iniquidade e poder apresentam uma estruturação cujas bases refletem pressupostos análogos; principalmente as sociólogas feministas, que estão embrenhadas em demonstrar quais as qualidades tipicamente esperadas do sexo feminino, social e historicamente subjugadas ou valorizadas, celebradas ou negadas.
As ramificações feministas a abordarem as repercussões derivadas das diferenças de género são significativas: feminismo liberal, feminismo radical, feminismo existencial, feminismo psicanalítico, feminismo socialista, feminismo pós-moderno e a teoria queer. Contudo, toda esta variedade não é sinónima de novidade, pelo que o núcleo do pensamento feminista se distribui por três destas vagas, a saber:
- O feminismo liberal, cujo alvo a demolir era o pensamento liberal clássico, imerso numa concepção da natureza humana que se distinguia pela capacidade do pensamento racional, que supostamente era um exclusivo do sexo masculino em contraste com a natureza emotiva da mulher. Ao argumentarem que a preponderância para o pensamento racional é imanente a todos os seres humanos, este movimento feminista situou as diferenças observadas na divisão sexual do trabalho não na diferença de “naturezas” dos dois sexos, mas como consequência das limitadas oportunidades sociais das mulheres participarem no discurso público, que com a vida doméstica e maternidade se tornavam praticamente nulas. Mas o quadro de referências quanto às qualidades desejadas para uma mulher emancipada, era produto das qualidades superiores observadas entre o sexo masculino, e as mulheres eram conceptualizadas como tendo os mesmos desejos, essências e capacidades mentais que os homens.
- Já o feminismo radical desafiou a noção implícita no feminismo liberal, de que a mulher é biologicamente inferior ao homem, de que os traços masculinos são qualidades ensejadas, e de que a equidade social, laboral ou política entre os sexos passa por definir um mundo de oportunidades baseado nos valores masculinos. Isto porque existe um abismo diferencial entre os dois sexos que não determina a inferioridade da mulher, mas que no entanto, contribui para a sua opressão. Por outro lado, a experiência de género é entendida como um resultado da organização das estruturas sociopolíticas do tempo, em que patriarcado e capitalismo caminham associados, uma vez que o racionalismo económico e a autoridade e superioridade se associam entre si, tendo como emblema o corpo masculino
- Com o feminismo pós-moderno, consagra-se a crítica dos dois movimentos precedentes, na medida em que para este movimento não existe uma oposição entre o sexo biológico e construção social do género: ou seja, a comparação do sexo com o género não é a comparação de um dado natural com um dado social, mas a comparação entre dois subprodutos do todo social, uma vez que para esta variedade de feminismo, não existem traços incorporados nos dois sexos que existam independentemente da observação e da interpretação, que são critérios que abrangem uma sequência sociohistórica; os quais acabam por ser naturalizados, contribuindo para certos determinismo biológicos do género, compreendidos como as técnicas do corpo específicas a cada sexo.
References:
- A. Meade, Teresa e Merry E. Wiesner-Hanks (2004), A Companion to Gender, Oxford, Blackwell Publisher.