Origem do modelo triangular da marca
Antes de abordar o modelo triangular da marca em si, importa esclarecer as razões que contribuíram para a sua concepção.
A definição jurídica da marca é fonte de algumas visões limitadas sobre o conceito de marca. Estas limitações foram sintetizadas pelos autores Paulo de Lencastre e Ana Côrte-Real na forma de três miopias (conceito emprestado de Levitt, em 1960, que utilizou o termo “miopias do marketing” para explicar a visão limitada do marketing ao desconsiderar o produto do marketing como benefício e o “esquecimento” de que a gestão marca, mais do que o rótulo, envolve o que o rótulo significa, e a interpretação desta relação pelos públicos):
- Miopia do rótulo (label myopia): consiste na restrição da gestão de marcas à criação e gestão de sinais gráficos para o produto tangível de forma a identificá-lo distintamente de produtos semelhantes da concorrência.
- Miopia do produto (product myopia): ver a marca como uma parte do produto, uma das variáveis do clássico marketing-mix.
- Miopia do cliente (customer myopia): ver a marca na perspectiva da relação vendedor-cliente, esquecendo que a actividade da marca não se restringe a produtos e clientes mas à pluralidade das relações de troca da organização com os seus públicos.
A marca é considerada um sinal, tanto juridicamente como em marketing. Por isso, os autores voltaram-se para a semiótica, a ciência dos sinais, como base para o modelo que integra os diferentes componentes do sinal e das relações entre ambos. Charles Peirce, que contribuiu enormemente para a semiótica, concebe que o sinal é uma entidade triádica composta por: sinal, em sentido estrito; objecto a que se refere o sinal; interpretante, que é o efeito que o sinal cria na mente de quem o recebe. Esta concepção triádica permite dar resposta às miopias da marca: a miopia do rótulo corresponde à miopia do sinal; a miopia do produto corresponde à miopia do objecto; a miopia do cliente corresponde à miopia do interpretante.
Modelo triangular da marca
Com base na concepção triádica de Peirce, os autores desenvolveram um modelo descritivo da marca assente em três pilares, conhecido como modelo triangular da marca.
- Pilar da identidade: engloba um conjunto de sinais de identidade da marca e das marcas que a ela estão associadas.
- Pilar do objecto: engloba diferentes ofertas da marca, bem como a organização e acções de marketing que as suportam.
- Pilar do mercado: engloba os públicos-alvo e as suas diferentes respostas à marca.
Relativamente a este modelo, há que salientar o carácter tendencialmente permanente do identity-mix (pilar da identidade) e o carácter tendencialmente adaptativo do marketing-mix (pilar do objecto). As variáveis identity-mix e marketing-mix correspondem ao carácter emissor da marca enquanto que a recepção da marca cabe ao response-mix, ou seja, os resultados obtidos pela marca junto do seu public-mix.
Modelo Triangular da Marca
Pilar da identidade da marca
O identity-mix da marca é composto pelo nome e pelos restantes sinais da identidade da marca. É possível fazer a distinção entre três níveis da identidade da marca:
- Identidade central: o sinal apresentado em primeiro lugar pela marca, normalmente o seu nome.
- Identidade efectiva: a expressão ou expressões gráficas da identidade central que foram ou podem ser registadas, nomeadamente, nome, ortografia e logótipo.
- Identidade alargada: engloba todos os outros sinais da identidade da marca que podem ser protegidos pela lei (slogan, jingle, rótulo, design específico, personagem e outros elementos da identidade corporativa).
Pilar do objecto da marca
Existem três pontos a ter em consideração relativamente a este pilar. Primeiro, o objecto da marca é a pessoa física ou jurídica identificado pelo nome da marca. Segue-se a forma como a organização se desdobra em diferentes produtos (produto, aqui, deve ser entendido como uma relação de troca proposta a um público-alvo). Finalmente, para cada um desses produtos deve existir um conjunto de acções que favoreçam a sua venda/troca, nomeadamente, através do marketing-mix. Neste sentido, podemos distinguir três níveis do produto (product-mix).
- Produto central: benefício essencial oferecido pela marca; a parte do objecto que a marca apresenta em primeiro lugar.
- Produto efectivo: conjunto de actividades que tangibilizam o benefício essencial oferecido; corresponde à variável do produto no marketing-mix.
- Produto ampliado: todos os serviços adicionais que normalmente acompanham a oferta e suportam as trocas entre a marca e os seus públicos-alvo; correspondem a todas as variáveis do marketing-mix.
Pilar do mercado
O mercado é compreendido como o grupo físico ou jurídico de pessoas que constituem o público da marca, ou seja, que têm alguma relevância para a marca devido à importância das relações de troca estabelecidas. Existem diferentes públicos (clientes, consumidores, fornecedores, etc.) e todos eles têm diferentes reacções à marca porque os relacionamentos de troca são diferentes, logo, expectativas diferentes. Também no response-mix é possível distinguir três níveis.
- Resposta central: a resposta mais imediata que um indivíduo tem quando é exposto a um sinal da marca; a top of mind das associações à marca e que define o seu posicionamento.
- Resposta efectiva: é já uma resposta mais estrutura dada pelo indivíduo à marca e pertence ao domínio qualitativo das associações à marca (imagem da marca); inclui as marcas associadas devido aos pontos de paridade, e de como delas se distingue via diferenciação.
- Resposta ampliada: todas as possíveis reacções que teoricamente um indivíduo pode ter porque são detectáveis em maior ou menor escala ao nível da imagem espontânea dos indivíduos de um mesmo público da marca; domínio do estudo quantitativo da marca, cujos outputs podem ser respostas como: notoriedade, estima, preferência, adesão, fidelidade, e no limite a quantificação do valor da marca.
O valor da marca depende do valor dos três pilares que a constituem. Numa primeira fase, depende dos pilares ligados à sua emissão: o identity-mix e o marketing-mix. Contudo, o valor da marca deve ser avaliado ao nível da recepção da marca, ou seja, do response-mix, nas respostas obtidas junto dos seus públicos.
References:
Lencastre, P. & Côrte-Real, A. (2010). One, two, three: A practical brand anatomy. Brand management 17 (6). 399-412.