A transferência ou fuga da Coroa portuguesa para o Brasil faz parte da história pitoresca da formação embrionária de um Brasil Império, no início do século XIX. Na frase do historiador Georges Duby,’ acontecimentos sensacionais’ sucederam o episódio da família real portuguesa para o Brasil desde o ano de 1808, até a renúncia de Dom Pedro I, em 1831. O contexto histórico do ano de 1807, era a real ameaça francesa de Napoleão Bonaparte de invadir Portugal com suas temíveis tropas, caso o Príncipe Regente luso, Dom João, insistisse em manter relações comerciais com a Inglaterra – principal rival econômica dos franceses ( Bloqueio Continental). Após a Revolução Francesa e a expansão das Ideias Iluministas no continente europeu, as monarquias europeias temiam por sua sobrevivência.
Em Portugal, a ação diplomática caminhava no sentido de preservar a corte portuguesa e de seguir a ação do conselheiro Rodrigo de Souza Coutinho, que era de transferir a sede do Império Português para a América. Em 23 de novembro de 1807, o jornal parisiense Le Moniteur, chegava a Lisboa com o ultimato de Napoleão. A família real portuguesa, temendo ser destronada, partiu às pressas para o Brasil, sob a proteção da marinha inglesa em direção à América.
A Corte portuguesa partiu no dia 29 de novembro, pela manhã. Cerca de 15 nil pessoas embarcaram para o Brasil. Quando o general francês Junot, responsável por marchar com as tropas francesas para Portugal, chegou a Lisboa, avistou a frota portuguesa partindo em direção ao Mar e ficou então ‘ a ver navios’ – expressão esta que surgiu, a partir deste episódio.
Ao partirem, a população portuguesa ficou abandonada à própria sorte, já que não sabiam as razões para a fuga do seu rei e de sua corte- que também não deixou maiores explicações à população lusa, que se enfureceu.
Sobre as as embarcações, essas não eram suficientes para tantas pessoas e a alimentação se fazia à base de biscoitos, lentilha, azeite, repolho azedo e carne salgada (sendo porco ou bacalhau). A água era pouca e aprdrecia rapidamente. Dom João e Dona Carlota viajaram separados. Na Nau Príncipe Real Dom João viajou com a rainha D. Maria I e cerca de 1054 pessoas . Na Nau Afonso de Albuquerque, onde viajava a princesa Carlota Joaquina, houve até uma infestação de piolhos, fruto da precária higiene e do excesso de pessoas à bordo.
Após 54 dias de viagem , em 22 de Janeiro de 1808, Dom João desembarcou em Salvador, na Bahia. Na ocasião decretou a Abertura dos Portos às Nações Amigas, com o objetivo de normalizar o comércio externo, além de garantir que haveriam rendas alfandegárias para manter a corte portuguesa na nova sede do Império. Assim, outros países, além de Portugal, puderam vender e comprar produtos do Brasil. Do ponto de vista econômico, a Política de Dom João seguia as orientações do futuro Visconde de Cairu, José da Silva Lisboa – que era um defensor do liberalismo econômico.
No dia 07 de março de 1808, Dom João e a corte portuguesa desembarcaram no Rio de Janeiro, a então capital da colônia. O Rio de Janeiro passou por um intenso processo de reconstrução e reforma urbana , baseada na ideia de que a antiga colônia se transformaria em sede do governo imperial, ou melhor, em nova residência real, hospedando o Príncipe Regente, a família real, e os nobres exilados. Havia uma preocupação de D.João em dar ‘ares civilizados’ europeus à nova sede imperial. A exemplo tem-se a criação de entidades de caráter científico e cultural como a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios; o Jardim Botânico e a Real Biblioteca.
Dom João foi aclamado imperador em fevereiro de 1818, após dois anos da morte da rainha D.Maria I. Na ocasião, recebeu o título de Dom João VI .Permaneceu 13 anos na América à frente do Império Português, período este conhecido na historiografia brasileira por Período Joanino (1808-1821).
References:
DIAS, M. Odila. “A interiorização da metrópole, 1808-1853.” In: MOTA, C. G. 1822 Dimensões, pp. 160-184.
GOMES,Laurentino. 1808: como uma rainha louca, um príncipe medroso e uma corte corrupta enganaram Napoleão e mudaram a história de Portugal e do Brasil. Rio de Janeiro: Planeta, 2007.
LIGHT, Kenneth. A viagem marítima da família real. A transferência da corte para o Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Zahar, 2008.
SCHWARCZ, Lília Moritz. O sol do Brasil: Nicolas-Antoine Taunay e as desventuras dos artistas franceses na corte de D. João. São Paulo: Companhia das Letras, 2008
O’NEIL, Thomas. A vinda da família real portuguesa para o Brasil. Rio de Janeiro: J. Olympio Ed., 2007.
SCHULTZ, K. “A era das revoluções e a transferência da corte portuguesa para o Rio de Janeiro (1790-1821).” In:
MALERBA, J. A Independência Brasileira, pp. 125-151.