- Básicos
O conceito de marginalidade foi originalmente introduzido pelo famoso sociólogo Robert Park nos seus estudos (1928), servindo como recurso heurístico nas análises relativas ao fenómeno da migração humana. Nesse artigo, o sociólogo referiu um novo tipo de “personalidade em emergência”, fruto da rapidíssima migração humana, e um padrão em constante pulsar no final do século XIX e início do século XX, que representaria profundas repercussões nas relações históricas e presentes entre diversos grupos.
Com grande interesse, neste ensaio somos confrontados com a discussão de Park sobre esta tal “personalidade em emergência”, que seria um híbrido cultural, um indivíduo vivendo e experienciando intimamente a vida cultural e a tradição de dois grupos distintos, um homem à margem de duas culturas e duas sociedades que nunca se interpenetram ou se fundem. Edwin Stonequist (1937) aplicou com maior extensão o conceito de marginalidade, sublinhando, no entanto, as características pessoais típicas de um “marginalizado”, e concentrando a sua crítica num relato sobre a condição mental dos ditos marginalizados.
O modelo iniciado com Park e aprofundado por Stonequist, tornou-se predominante e um ponto de referência nas ciências sociais, até Dickie Clark introduzir o termo “situação marginal” (1966), deslocando a tónica da discussão da personalidade do marginalizado para um ponto sociológico referencial. Assim, Clark completou o modelo proposto pelos antecessores, subvertendo e distorcendo a sociologia da marginalidade ao criar um modelo exclusivo do marginal, que possuiria o rótulo de “irracional e temperamental”. A enfâse de Clark nas “situações marginais” é importante não só pelo previamente referido, mas também por ter sedimentado o conceito no corpo disciplinar da sociologia e não da psicologia, ao mesmo tempo que tornava precursoras genésicas do conceito, as noções de “poder” e “privilégio”. Do mesmo modo, as situações marginais envolviam práticas históricas e políticas de legitimação de estatutos desequilibrados e “estruturas de oportunidade oportunistas”. De um modo geral, a abordagem de Clark forneceu as credenciais ao argumento de que a marginalidade apresenta diversas nuances, sendo complexa e multidimensional.
Com Park-Stonequist, o modelo sobre as condições de marginalidade incidia sobretudo na temática racial, étnica, religiosa, ou nos grupos culturais sujeitos a mundos contrastantes, mas com a complexificação das problemáticas sociais, tornou-se inexoravelmente insuficiente: daí o modelo ter sido alargado, de modo a incluir grupos intitulados como um “Outro” pela cultura dominante; a pretexto desse novo âmbito, encontramos as mulheres, os pobres, homossexuais, ou portadores de deficiências mentais e físicas. Mas central ao tópico da marginalidade, é a questão de quem produz e empunha o poder, quem estabelece políticas, qual a natureza das barreiras estruturais criadas, e quais as instituições afetadas. Contudo, a falta de acesso a direitos básicos não se traduz num papel associal do marginalizado, uma vez que a marginalização imposta é concebida para criar barreiras emocionais, sociais e estruturais: como consequência, um marginalizado está “dentro” e “fora” da sociedade, mas com acesso limitado e posições prescritas, e com um papel especial.
O conceito continua a ser útil na teoria sociológica, uma vez que descreve as encadeações e relações estruturais, permitindo ao sociólogo mapear, documentar e localizar quem é marginalizado e porquê, assim como demonstrar as consequências da marginalização num plano macrossocial.
References:
Dennis, R. (2005), Marginality, Power, and Social Structure, London, Elsevier.