Popularizado por Rich (1981), o conceito de heterossexualidade compulsória passa pelo pressuposto cultural de que tanto o homem como a mulher estão biologicamente predispostos à heterossexualidade. A assunção de que a biologia excluí do seu âmbito uma explicação naturalizada da homossexualidade, limita os humanos à atração pelo sexo oposto. Logo, a operação em torno da heterossexualidade compulsória envolve tipicamente a reificação e naturalização, ao passo que a homossexualidade é interpretada como um produto de uma disfunção psicológica ou um desvio de cunho pessoal: a partir deste ponto de vista, a homossexualidade é marginal uma vez que colide com as inclinações naturais do ser humano. Consequentemente, tendeu a ser disseminado um discurso hegemónico que suportava a heterossexualidade com o recurso à demonstração da heterossexualidade exclusiva de outros animais, ainda que Bagemihl (1999) tenha aduzido que a homossexualidade, enquanto comportamento sexual temporário, existe amplamente no reino animal.
Um dos resultados da naturalização da heterossexualidade e da estigmatização da homossexualidade, bissexualidade e do transgenderismo, manifesta-se na iniquidade do acesso aos meios culturais e institucionais. Por um lado, a institucionalização da heterossexualidade encontra-se em todos os níveis das sociedades ocidentais, onde o poder e o privilégio são dispostos em benefício dos heterossexuais, como na restrição do casamento civil aos heterossexuais (apesar de já ser legal em inúmeros pontos do mundo ocidental, o casamento gay).
Rich argumenta também que a validação dos heterossexuais em detrimento de casais do mesmo sexo, influencia a reprodução do privilégio masculino nas sociedades patriarcais através de meios políticos ou da violência social, uma vez que as sociedades ocidentais exibem o controlo masculino da vida institucional das mulheres, como o direito à maternidade, o aborto, ou a equidade do cargo profissional: deste modo, há um evidente sistema binário de opressão, pelo que a não participação nesta “estrutura heterossexual” resulta na marginalização e na negação do suporte social e institucional. Rich asserta que a naturalização da heterossexualidade e hegemónica a tal ponto, que mesmo as feministas falharam nos relatos produzidos sobre os efeitos que tal fenómeno tem sobre as mulheres oprimidas. É mesmo sugerido na sua obra que a heterossexualidade compulsória promove a instituição política da violência doméstica, entendida a naturalização da heterossexualidade como uma desculpa para o homem exercer gestos violentos contra a mulher, pois tal é um “desígnio biológico”.
O fervor da tese de Rich diminuiu com o passar dos anos, o que talvez se possa atribuir aos ganhos institucionais e culturais que gays e lésbicas têm vindo a adquirir desde 1981, desde então bastantemente disseminados (Widmer et al. 1998). Quer tal seja o resultado de uma compreensão individual e social sobre a homossexualidade enquanto processo natural ou não, a verdade é que gays e lésbicas conquistaram bastante terreno no que toca à igualdade institucional. Consequentemente, grande parte da discussão em torno da heterossexualidade compulsória virou-se para o exame do “heterossexismo”, isto é, o pressuposto de que a heterossexualidade deverá permanecer cultural e institucionalmente privilegiada.
Embora o heterossexismo opere num quadro onde a homofobia não apresenta tanta prevalência (em comparação ao cenário da heterossexualidade compulsória), Clausell e Fiske (2005), entre outros, demonstraram que o preconceito contra gays e lésbicas reflete cada vez mais a ambivalência: uma combinação de comportamentos positivos e negativos. Naturalmente, a ambivalência não é eficiente para a alteração deste panorama, o que atrasa o progresso da marcha de gays e lésbicas rumo à igualdade civil e cultural.