Conceito de Masoquismo
Freud considerou o comportamento masoquista a ponto mais incómodo das suas teorias pois afirmava que todos os seres humanos procuravam maximizar o prazer e diminuir o sofrimento e, por isso, teve de rever as suas teorias. Contrariamente ao que afirmava, nestes casos, os fenómenos dolorosos parecem dar prazer. De acordo com a doutrina psicanalítica, impunha-se explicar comportamentos como os de Sacher-Masoch, que procurava o orgasmo através da humilhação, e do Marquês de Sade, que obtinha excitação sexual através do sofrimento.
O masoquismo pode ser definido como sendo uma perversão sexual onde o individuo fica satisfeito com o sofrimento e a humilhação, porém, para Freud este conceito vai para além do entendimento que os sexólogos têm, reconhecendo, por um lado, que o masoquismo está presente em variados comportamentos sexuais (também na sexualidade infantil) e, por outro lado, que o masoquismo está presente em comportamentos que nada têm a ver com a sexualidade.
Em 1924, Freud introduz a expressão “masoquismo moral”, onde não há qualquer referência à sexualidade, mas que significa que o individuo sofra por algo mais valioso do que o seu bem-estar a curto prazo. O sujeito sente a necessidade de se envolver em situações de fracasso, de se queixar e sente-se constantemente em sofrimento. O gosto pelo fracasso pode estar relacionado com o medo de castração desde a infância, onde houve de facto uma frustração real ou sentida.
Fora do masoquismo moral existem outras formas de masoquismo e de autodestrutividade. É o caso da automutilação, onde o individuo inflige dor física a si próprio como forma de se sentir vivo e de esquecer um pouco a dor emocional ou, no caso das crianças, de chamarem a atenção dos cuidadores.
De acordo com a psicodinâmica, o termo masoquismo não reflete um individuo que goste de sofrer mas sim uma pessoa que vê o sofrimento como forma de atingir algo maior. Estes indivíduos torturam-se e sofrem pois assim já estão à espera do tipo de dor que vão sentir e, para eles, seria muito pior sentir aquele tipo de dor de forma inesperada. Contudo, há um conflito entre o impulso e a angústia que advém do comportamento masoquista.
O mundo afetivo do sujeito masoquista é muito parecido com o do depressivo: existe a predominância da tristeza e dos sentimentos de culpa, contudo no masoquismo estes sentimentos podem originar raiva e ressentimento. Isto é, o sujeito masoquista vê o seu sofrimento como injusto, sente-se vitimizado e amaldiçoado, enquanto o sujeito depressivo tem a fantasia de merecer a sua dor. No masoquismo de índole sexual, o sujeito pode, por um lado, ter tido experiencias onde o prazer sexual e a dor estivessem interligados, ou, por outro lado, sentir culpa relacionada ao orgasmo e, por isso, vê o “castigo” a que se sujeita como uma forma de obter o perdão. Existem autores que afirmam haver uma relação desta patologia com a excitação sentida pelas crianças vítimas de castigos corporais.
No que concerne os mecanismos de defesa desta patologia podemos nomear a introjeção, a idealização, a moralização e Freud, em 1920, fala ainda na “compulsão da repetição” pois as pessoas que mais tinham sofrido na infância pareciam repetir esse mesmo sofrimento na vida adulta, o que, para outros autores pode ser uma tentativa de recriar as vivências traumáticas de modo a dominá-las psicologicamente. Estes sujeitos têm a tendência para envolver outras pessoas no seu processo masoquista e a ter uma atitude desafiadora, o que muitas vezes dificulta o próprio processo terapêutico pois estão mais preocupados em obter uma vitória moral do que na resolução do seu problema. A negação também é muito frequente, já que não raras vezes os pacientes demonstram que estão em sofrimento e sentem-se abusadas mas defendem as boas intenções do individuo que lhes provoca tal sofrimento.
Nos indivíduos masoquistas, ao contrário dos depressivos, têm esperança e as perdas não foram tão devastadoras como para os depressivos. Vemos, nestas pessoas, historiais de perdas não choradas, pais críticos, situações de abuso e inversão de papéis, onde a criança se sente responsável pelos pais e, por isso, há uma tentativa por parte do Ego de se ajustar às exigências do superego.
O self masoquista é, em alguns aspetos, semelhante ao depressivo na medida em que os indivíduos se sentem sem valor e rejeitáveis, contudo sentem alguma grandiosidade ao contar as situações dolorosas pelas quais passaram e por vezes fazem-no com um sorriso no rosto. Como diz McWilliams em 2005 estas pessoas fazem uma “vinculação-através-do-sofrimento” e quando lhes são sugeridas alternativas às situações dolorosas rapidamente mudam de assunto. Ao contrário dos sujeitos depressivos, os indivíduos masoquistas admitem que a maldade lhes é externa, ou seja, está nos outros.
Terapeuticamente, no caso do masoquismo erógeno a abordagem é difícil porque os estímulos dolorosos são, na maior parte das vezes, prazerosos enquanto no masoquismo autoderrotista o individuo necessita de um modelo de afirmação positivo de modo a perceber que mesmo quando perde as estribeiras é tolerado.