Uma ideologia é um sistema de crenças partilhadas relevante para a ação social, a integração e estabilidade social, apesar de não ter que ser necessariamente verdadeira, pois em última análise, não é a função da sociedade de que a comunidade que serve tenha crenças verdadeiras sobre a sociedade. Antes, pelo contrário, cada grupo social decide a validade das suas crenças e dos outros: se determinado grupo acredita que o conjunto de crenças de outro grupo é falso, denominarão esse conjunto como uma ideologia. Implícita nesta denúncia está a asserção de que o primeiro grupo detém uma teoria mais acurada da sociedade. Contudo, tais afirmações são raras atualmente, dado que o termo ideologia perdeu aplicabilidade: depois da viragem cultural o conceito perdeu a sua proeminência original nas narrativas produzidas, pois no discurso quotidiano da vida e mais especializado da academia, a crença de que existe uma única teoria verdadeira sobre a sociedade foi desacreditada, o que se deve ao pluralismo instaurado com o advento das pós-modernidade.
No sentido moderno, o termo ideologia foi primeiramente usado em 1796 por Destutt de Tracy no contexto da Revolução Francesa. Este tentou constituir uma ciência das ideias com uma abordagem positivista. Os “ideólogos” tornaram-se numa influente escola de pensamento na França de inícios do século XIX. É Napoleão o inaugurador da crítica da razão pura dos ideólogos, que segundo o primeiro, andavam a brincar às abstrações e ignorando assim as necessidades políticas imediatas: com esta jogada nasce a crítica da ideologia.
Com a publicação da Ideologia Alemã, Karl Marx e Friedrich Engels atualizam o sentido do termo, o que se traduz nas seguintes consequências: o uso marxiano do termo ideologia refere-se, tal como uma mitologia, a uma concepção total da sociedade moderna, onde existe uma divisão social do trabalho entre duas classes, sendo que uma das classes domina a outra por intermédio do controlo dos meios de produção, o que resulta na opacidade da forma como a sociedade funciona; esta opacidade conduz à falsa consciência, às falsas ideias e imagens sobre a regulamentação da sociedade, o que provoca a contaminação e imposição ideológica, e resulta na dominação da classe superior: “as ideias dominantes são as ideias das classes dominantes” (Marx).
Durante o século XX, grande parte da esquerda intelectual esteve envolvida na crítica da ideologia, sobretudo depois da dita “viragem cultural”. Antes desta viragem, surgiram dois enormes desafios: o primeiro consistiu em provar que as ideologias não conheceram o seu termo, e tal tarefa foi tomada por figuras como Zizek e Pierre Bourdieu entre outras; o segundo consistiu na desmistificação do marxismo, compromisso assumido por marxistas importantes como Gramsci e Lenine, que apontaram que muitos dos seguidores falharam em compreender o próprio marxismo como uma ideologia. Consequentemente, a crítica marxista deixou de ser o ponto de vista privilegiado, e talvez ninguém o tenho apontado tão excelsamente como Karl Mannheim, de acordo com o qual “a hermenêutica da suspeita necessita de ser totalizada” para ser eficaz, o que conduz à derrota do próprio ponto de vista marxista.
No discurso público contemporâneo, existem demasiadas atitudes que de um ponto de vista sociológico são ideológicas, pelo que as ideologias são importantíssimas para a sociologia: sem ideologias não haveria a necessidade do saber sociológico, e em última análise, de nenhum saber. É o facto de a opinião dos indivíduos acerca do funcionamento da sociedade diferir do modus operandi da sociedade, que torna indispensável uma ciência que estude a estruturação da sociedade, o que basicamente se transformou no manifesto comum aos diversos saberes e praticantes.
References:
Eagleton, T. (1991) Ideology: An Introduction. Verso, New York.
Mannheim, K. (1936) Ideology and Utopia: An Introduction to the Sociolocy of Knowledge. Harvest, New York.