Donald Davidson (1917-2003) foi um dos mais importantes filósofos da última metade do século XX, sendo a receção e influência do seu trabalho na filosofia americana, detentora da mesma magnitude que caracterizou a aceitação do trabalho de William Quine.
A abordagem geral de Davidson à metafísica parte de uma longa tradição filosófica que tenta derivar as características básicas da realidade da estrutura da linguagem. O ângulo particular que Davidson introduz, nasce da sugestão de que a estrutura da linguagem e as correspondentes revelações sobre as características mais amplas da realidade, são refractadas no esforço de se formular uma teoria compreensiva e formal da verdade para uma versão canonizada da linguagem natural.
A aplicação específica e mais original deste método à metafísica pode ser encontrada na declaração de Davidson de que tal teoria, sendo avançada sobre um fragmento linguístico que contém, por exemplo, a proposição a caldeira explodiu, produz uma ontologia de eventos. Isto é, produz a ideia de que eventos como explosões existem particularmente, do mesmo modo que uma caldeira. Esta sugestão não só é apeladora como notavelmente natural, uma vez que permite descrever o mesmo evento de formas diferentes: a caldeira explodiu, pode ser entendida como um acidente doméstico ou uma explosão.
Davidson estende este método a proposições como O João barrou manteiga no pão, argumentando que estas proposições sobre a agência humana devem também ser tratadas como quantificando eventos que possuem descrições intencionais. Assim, tal ampliação do método possibilita um tratamento teórico satisfatório de proposições com modificadores adverbiais.
Aprofundando este ponto, Davidson analisa proposições que evidenciem situações de causa e efeito, tal como, ao carregar no botão ele provocou a explosão. A ontologia dos eventos permite a Davidson formular uma distinção entre dois aspetos diferentes que esta proposição contém: relações causais entre eventos, que são puramente extensivos, e explicações causais, que são intencionais no sentido em que, ao contrário das relações causais, dependem do modo como os eventos são descritos.
Posteriormente, Davidson desenvolve esta distinção para fornecer uma solução para o problema tradicional corpo/mente. Os eventos mentais são idênticos aos eventos físicos, mas quando reunimos os eventos mentais em tipos, há uma objeção à identidade entre os eventos reunidos em tipos e os eventos físicos reunidos em tipos. Isto, porque ao contrário dos particulares, os tipos dependem essencialmente dos conceitos que empregamos na descrição de eventos; e não existem leis que correlacionem os conceitos mentais com os conceitos que empregamos na descrição física de eventos. Assim, no plano conceptual não há uma redução do mental ao físico, mas, ontologicamente falando, tal não implica o dualismo corpo/mente, uma vez que qualquer evento mental é idêntico a algum evento físico.
Adicionalmente, Davidson postulou uma relação de dependência entre a mente e o corpo denominada superveniência. Este conceito baseia-se na noção de que um predicado psicológico não distinguirá nada que não seja distinguido num predicado físico. A motivação subjacente a tal dependência é uma tentativa de se estabelecer um paralelo entre a filosofia da mente, e uma posição respetiva aos estudos dos valores, que nega ao mesmo tempo a redução dos valores a factos naturais, sem que os torne misteriosamente autónomos. Com o conceito de superveniência, Davidson argumentou que a redução das propriedades mentais às propriedades físicas seria compatível com a relação de dependência entre os dois tipos de propriedades, e assim desaprovando quem dissesse que duas coisas fisicamente indistintas seriam mentalmente diferentes.
Foi aberto o caminho para uma maior compreensão no estudo científico da natureza física, sem que se fizessem concessões ao reducionismo mente/corpo. Existem outros aspetos da filosofia de Davidson, tal como as suas visões sobre o realismo, objetividade e natureza da verdade, que, não obstante constituírem as suas investigações metafísicas, encontram melhor esclarecimento no campo da epistemologia.
References:
Davidson, Donald (2006), The Essential Davidson, Oxford, Clarendon Press.