A história da humanidade, tal como foi legada pelos antecessores gregos, sejam eles Heródoto ou Tucídides, está recheada de comparações, uma vez que o ser humano, para se compreender a si transgredindo a semelhança biológica, tornou-se intérprete de costumes, tradições e instituições de cariz diversificado, de forma a descobrir na esfera social, onde situar a mesmidade e ipseidade do “outro” estrangeiro.
Mas somente no século XIX é que o método comparativo ascendeu enquanto metodologia científica, conferindo uma nova dinâmica à antropologia. Passando pelas correntes teóricas como o evolucionismo, o difusionismo, o funcionalismo e o estruturalismo, esta forma de mapeamento marcou (logicamente com as devidas idiossincrasias epistemológicas que assinam a identidade de uma teoria) presença assiduamente. Contudo, graças ao cepticismo de Evans-Pritchard (1963), surgiram reservas quanto à possibilidade da comparação entre as sociedades. O advento do relativismo cultural foi a pedra de toque.
Métodos de Comparação
- Comparação Ilustrativa
À ilustração comparativa falta o cariz sistemático do material etnográfico reunido. Esta comparação consiste na seleção casualística de casos, de modo a encerrar a linha circular do argumento antropológico, pois as ilustrações são escolhidas porque sustentam fortemente o ponto de vista deste, independentemente das necessárias considerações desse mesmo aspeto na sua variação cultural.
- Comparação de Universos Completos
Esta metodologia permite a cobertura total de um determinado “universo” sociocultural. A área de cobertura pode ser regional, variando a região entre uma pequena área ou um continente, e tendo o ordenamento geográfico maior proeminência, ou global, enfatizando-se o ordenamento, não geograficamente, mas sim por referência a um tópico ou conceito. Esta estratégia comparativa é seletiva porque não se podem cobrir na totalidade, algumas das culturas conhecidas.
Unidades e Itens de Comparação
Uma unidade ou item de comparação é como um fragmento selecionado a partir do estudo de um segmento do mundo social, e serve de referência face ao fragmento análogo ou de semelhante natureza da outra sociedade, pelo que a divisão entre unidade e item talvez seja forçada, uma vez que é impossível comparar uma totalidade social com outra totalidade social, a não ser que se concebam campos de relevância no plano da comparação, isto é, por exemplo, se assuma que a religião no Brasil é um fenómeno com maior abrangência do que as competições de cerveja na cidade de Fortaleza. Por conseguinte, a primeira problemática assume maior importância sociológica que a segunda, e portanto, é um complexo de maior totalidade que pode ser nivelado com o fenómeno religioso de outro país. Praticamente não existem limites quanto ao “átomo” a selecionar de dada sociedade para um trabalho de comparação: é possível pegar na Ilíada de Homero e compará-la com a narrativa épica que é o Mahabharata; comparar sistemas políticos, digamos, a democracia com o socialismo; ou comparar uma relação de parentesco, como a relação entre mãe e filho em vários pontos do mundo.
Objetivo da Comparação
O objetivo da comparação antropológica é, logicamente, a generalização. Mas que não se entenda esta generalização como a descoberta das leis fundamentais que comandam a sociedade: é erróneo pressupor que para os juízos morais existem leis tal como a segunda lei de Newton, de acordo com a qual, F=ma, ou seja, a força é sempre diretamente equivalente ao produto da aceleração de um corpo pela massa.
A comparação antropológica recorre inúmeras vezes à inferência histórica para reconstruir sequências culturais. Mas esta reconstrução é frágil porque é hipotética à falta de evidências históricas irrefutáveis. A construção tipológica é outro dos destinos da comparação, que Raymond Firth descreveu como um quadro de categorias que na sua unidade possui as variantes. Este esquema tipológico divide-se modalmente num quadro de comparação ao nível sincrónico ou ao nível diacrónico. Aceita-se que a comparação é historicamente determinada, mas tal fragilidade não torna impermeável uma certa “generalização” da parte do labor antropológico, pois mesmo que não seja encontrada uma mesma causa para realidades sociais semelhantes, o facto de essa semelhança se manifestar demonstra a correlação existente, e tal dado é significativo relativamente ao que se pode constatar sobre a natureza humana.
References:
- Evans-Pritchard, E.E. (1963) The Comparative Method in Social Anthropology, London, The Athlone Press.