A aliteração é um recurso expressivo que consiste na repetição de sons consonânticos, quer sejam letras, sílabas ou simplesmente sons, em várias palavras consecutivas numa frase ou em versos.
Neste sentido, e atuando ao nível da fonética, a sua utilização requer uma escolha de palavras muito peculiar quanto à sua sonoridade que vise, portanto, oferecer alguma musicalidade ao texto, intensificar uma determinada ideia ou dar maior expressividade a certos sentimentos.
Fernando Pessoa ortónimo foi um dos poetas portugueses que mais recorreu a este processo estilístico para enfatizar, por exemplo, algo desagradável como a solidão. No poema «Natal…Na província neva» 1, ao abordar a temática da nostalgia de infância, Pessoa faz uso da aliteração dos sons sibilantes, ou seja, da repetição do /s/ no verso “Estou só e sonho saudade” para, assim, destacar a saudade que é sentida de modo intenso numa evocação do passado. Já no poema «Abat-jour» 2, a aliteração em [ʃ] no verso “a luz que oscila no chão” caracteriza a difusão da luminosidade no espaço onde se encontra.
Também é de referir que muitas aliterações comportam em si um efeito lúdico-pedagógico como é o caso do tão famoso trava-línguas “O rato roeu a rolha da garrafa de rum do rei da Rússia”.
Outros exemplos de aliterações:
- “Menina e moça me levaram de casa de minha mãe para muito longe.” Bernardim Ribeiro
- “O tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem. O tempo respondeu ao tempo que o tempo tem tanto tempo quanto tempo o tempo tem.”
Nota: não confundir a aliteração com a assonância, no sentido em que esta última consiste na repetição de sons vocálicos em várias palavras consecutivas numa frase ou em versos. Exemplo: “Sino de Belém, pelos que inda vêm! / Sino de Belém bate bem-bem-bem. / Sino da Paixão, pelos que lá vão! / Sino da Paixão bate bão-bão-bão.” Manuel Bandeira, «Poesia Completa e Prosa»
References:
1 Fernando Pessoa, Fernando. Poesias (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995) Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/2449
2 Fernando Pessoa, Fernando. Poesias (Nota explicativa de João Gaspar Simões e Luiz de Montalvor.) Lisboa: Ática, 1942 (15ª ed. 1995) Disponível em: http://arquivopessoa.net/textos/2103