O teatro do absurdo, também designado antiteatro, diz respeito a todo um leque de textos dramáticos que surgiram nos anos 50 em alguns países da Europa, sobretudo em França. A designação foi atribuída pelo crítico de teatro húngaro Martin Esslin (1918-2002) às peças de Samuel Beckett (1906-1989), Eugène Ionesco (1909-1994), Jean Genet (1910-1986), Arthur Adamov (1908-1970), Harold Pinter (1930-2008), ou Fernando Arrabal por se basearem, essencialmente, no absurdo das situações e na desestruturação da linguagem.
Embora imbuídos no espírito do pós-guerra e partilhando a visão trágica e pessimista da condição humana oriunda do existencialismo sartriano, os autores do teatro do absurdo também exploraram o filão surrealista. Na verdade, o teatro do absurdo não nasceu espontaneamente, antes apresenta uma genealogia, pois foi beber diretamente ao movimento surrealista. Existe, de facto, uma certa similitude entre a revolução que os surrealistas pretendiam operar na arte e na própria realidade (nomeadamente quando reclamavam para si o direito de oferecer à mente e aos sentidos uma realidade alternativa, que não fosse captável nem pela razão, nem pelos cinco sentidos) e aquilo que os dramaturgos do teatro do absurdo pretendiam instaurar em cena. Também estes últimos tinham como objetivo desconstruir a realidade e estilhaçar por completo as conceções dramaturgas convencionais e as traves-mestras de qualquer peça de teatro clássica, ou seja, a ação, a coerência das personagens, a delimitação do espaço e as coordenadas temporais. Surgiram, assim, peças sem qualquer intriga, apresentando quadros bastante negros com um número reduzido de personagens que, na verdade, se reduzem muitas vezes a arquétipos.
Uma outra revolução consistente do teatro do absurdo foi a mistura de géneros, de tons e de registos, resultando num hibridismo que, aliás, acabou por trazer ao de cima a errância de alguns dos seus autores: Ionesco, de origem romena, Beckett, de origem irlandesa, e Adamov, de origem russa, eram todos homens exilados da pátria por vontade própria, nenhum era originariamente francês. De facto, é possível delinear as várias situações biográficas destes autores nas suas obras, quais alegorias que abordam temas como o exílio humano, a incomunicabilidade, a solidão inevitável e a evanescência das relações humanas. Neste sentido, os autores do teatro do absurdo, cada um à sua maneira, foram bastante críticos quer da sociedade humana, quer do enquistamento, ou da necrose intelectual, da maioria das pessoas. Adotaram lugares- comuns, recorreram a truísmos, chavões ou clichés essencialmente para não se confrontarem com o monstro que mais os aterrorizava, a solidão.
O teatro de Eugène Ionesco, a título de exemplo, é considerado um teatro místico poético, imaginativo, surreal e angustiante que provoca, muitas vezes, ao espetador a sensação de estar a ser confrontado com um pesadelo. Influenciado por Bertold Brecht (1898-1956), o dramaturgo também optou, posteriormente, por peças que, a par de preocupações metafísicas, envolvessem temáticas políticas e sociais1. Em muitos aspetos as suas obras representam o grito de liberdade dos vários povos do mundo.
Por seu turno, as peças de Samuel Beckett apresentam uma maior profundidade na medida em que a nudez de cenário, a ausência de objetos cénicos e o número reduzido de personagens jogam com as justaposições e contribuem para uma certa desumanização, para um certo vazio. O seu teatro revela, também, alguma violência, já que muitas das suas personagens são mutiladas, alegoria da incompletude, ou estão presas, alegoria do desterro.
Assim, neste contexto, é importante destacar a importância das vozes e das expressões corporais das personagens, nomeadamente em palco, para poderem fazer jus ao ideário do absurdo, cómico, mas grotesco e angustiante, personificando determinadas abstrações e tornando visível o invisível.
1 A peça mais conhecida de Eugène Ionesco que aborda o totalitarismo intitula-se, no original, «Rhinocéros» (1959), uma alegoria de todos aqueles que aderiram ao nazismo e ao estalinismo.