A “Primavera Marcelista” é uma expressão que designa a primeira fase do governo de Marcello Caetano (1906-1980), último líder do Estado Novo, mais especificamente entre 1968 e 1971, e que traduziu toda uma esperança quanto ao desabrochar do país, o qual parecia estar a abrir caminho para a democracia.
Depois do acidente vascular cerebral que Salazar sofrera, dia que ficara marcado para a História como “o dia em que Salazar caiu da cadeira”, foi Marcelo Caetano, aos 62 anos, quem tomou posse do país. Assim, confrontado com uma panóplia variada de problemas, que iam desde a organização interna de Portugal à questão do Ultramar, Caetano optou por uma política de modernização e liberalização do país, a qual entrecruzava os interesses políticos dos sectores conservadores com as exigências da democratização, nomeadamente por parte dos socialistas.
Neste sentido, uma das medidas com maior impacto social foi a autorização do regresso de alguns exilados políticos, como Mário Soares, ou o bispo do Porto. Também importantes foram o direito ao voto que foi concedido às mulheres alfabetizadas, a melhoria da assistência social, o lançamento de propostas de democratização do ensino, a moderação da repressão, ou seja, a diminuição do prazo de algumas detenções, a mudança do nome PIDE (Polícia Internacional e de Defesa do Estado) para DGS (Direção-Geral de Segurança), a eliminação de algumas restrições quanto às atividades dos sindicatos e a possibilidade da participação da oposição nas eleições legislativas de 1969.
No que diz respeito à economia, Marcelo Caetano deu um impulso significativo a este setor ao ter terminado com o condicionalismo industrial e ao ter contratado vários tecnocratas de outros países, os quais desenvolveram importantes projetos como, por exemplo, o porto de Sines, a barragem do Alqueva e a construção de autoestradas. Consequentemente, foram criados mais postos de trabalho, o PIB crescia a uma média de 7,5% e o país abria as suas portas ao estrangeiro.
Relativamente à questão do Ultramar, embora Marcelo Caetano defendesse uma política de “progressivo desenvolvimento e a crescente autonomia das províncias ultramarinas”[1], em grande parte porque estava consciente da pressão internacional que se fazia sentir sobre Portugal, optou por prosseguir com a defesa da opção militar até se encontrar uma solução política para o problema. No entanto, iniciou o plano da “autonomia progressiva e participada do governo”, que consistia na participação das populações coloniais nas estruturas políticas e administrativas dos respetivos estados coloniais, embora se subentendesse que este processo significaria a supremacia branca, ou a manutenção da matriz portuguesa. [2]
Toda esta osmose característica do marcelismo, ao combinar uma política conservadora com uma política de abertura, desencadeou reações bastante díspares. Se a verdade é que não conseguiu “agradar a gregos e troianos”, também há a sublinhar a importância do período para a história de Portugal, nomeadamente quanto ao facto de Caetano ter descentralizado o poder e de ter devolvido aos portugueses alguma esperança.
References:
[1] Baptista, António Alçada. Conversas com Marcelo Caetano. Lisboa: Ed. Moraes, 1973
[2] Seminário Internacional Comunidades Imaginadas, Coimbra, 2008. Comunidades imaginadas: nação e nacionalismos em África. Coimbra: [s.n.], 2008