São comuns, na nomenclatura médica, expressões consagradas pelo uso, mas imperfeitas. Uma boa análise léxíca pode mostrar que praticamente todas podem ser aperfeiçoadas se essa escolha for racionalizada.
Os dois termos em questão constam da língua portuguesa e dos usos médicos, como se vê na web, o que, do ponto de vista linguístico, dá legitimidade a todos eles com o mesmo sentido de transmitir a ideia de o paciente ser incapaz de controlar a exoneração fecal.
Em medicina, a significação habitual de incontinência é incapacidade total ou parcial de controlar a liberação de líquidos orgânicos por mecanismos esfinctéricos ou valvulares. Em busca da denominação mais apropriada entre essas expressões, convém buscar a etimologia para saber que continência significa capacidade de um elemento continente conter – nos sentidos de abrigar e reter um conteúdo em si. Do latim continere, conter, de cum, com, e tenere, ter, segurar (A. Ferreira, Dic. lat. port., 1996). No caso, o ânus é um dos elementos que possibilitam a continência fecal e de flatos no intestino, que é o órgão continente.
Pode-se afirmar que incontinência provém de in (no sentido de negação ou privação) e continência (ato de conter); esta advém de conter (abrigar e reter) e –ência (ação de), e conter vem de com e ter, o que indica conteúdo e continente. Nesse contexto, incontinência refere-se à incapacidade de conter e reter um conteúdo.
A incapacidade primária é do ânus não funcional, mas a incontinência se refere a um conteúdo, que é aqui representado por fezes, gases e outros elementos – orgânicos ou não. Assim, o intestino (continente) e, por extensão, o próprio paciente, apresentam incontinência fecal e de flatos. Nesse contexto, incontinência anal pode ser um termo questionado, já que o ânus flácido e inoperante pode, em algum momento, conter fezes e flatos que passam por ele. Contudo, sua função não é ser continente, mas assegurar continência fecal e gasosa da porção terminal do intestino.
Acrescenta-se que a função esfinctérica do ânus é fortemente apoiada pela ação do músculo puborretal, que age na ampola retal, de modo que a expressão incontinência anal pode ser incompleta.
Incontinência fecal é a denominação mais numerosa na literatura, e a lei do uso é importante passo nas determinações de preferência de uso. Fecal e gasosa são as qualificações ou especificações adjetivas referentes ao substantivo incontinência, ou seja, a incontinência, incapacidade de conter e reter em si o conteúdo fecal e gasoso. Assim, também se diz com maior número de usos incontinência urinária (como incapacidade de conter e reter urina), incontinência espermática, incontinência gástrica, incontinência intestinal, incontinência biliar e por aí além. No contexto terminológico com mais precisão, o termo incontinência intestinal pode ser usado como incapacidade de conter voluntariamente gases e fezes.
Os usos populares habitualmente transformam os sentidos dos termos originais por motivo de praticidade. Em casos de necessidade de diferenciação ou desambiguação vocabular, a etimologia pode ser fator determinante de valor útil.
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