Massangano (Angola)

Apresentação da localidade de Massangano (Angola): caracterização sócio-económica e demográfica, história, património histórico e edificado e património natural.

Massangano é uma pequena localidade angolana pertencente ao munícipio de Cambambe-Dondo, província do Kwanza Norte. A localidade dista cerca de 25 km da cidade do Dondo, capital do município. É uma comunidade pequena, localizada nas nas margens do rio Kwanza, composta maioritariamente por camponeses e pescadores. O acesso à localidade é possível quer através de carro, quer de barco.

No século XVII, Massangano foi a capital civil e a sede governamental da Igreja Católica na então província portuguesa de Angola. A fortificação foi erguida por Paulo Dias de Novais (ou por Manuel Cerveira Pereira, segundo outros autores), nas margens do Rio Kwanza, em 1583, com a função de defesa do presídio (estabelecimento de colonização militar) que assegurava a ocupação portuguesa na região, alargando-a.

Além de marcar a presença militar portuguesa, este estabelecimento garantia a integridade das redes comerciais, incluindo a de tráfico de escravos para o continente americano. Há registos de terem sido edificadas, ainda no Rio Kwanza, a fortaleza de Muxima e uma outra no Tombo, de que não existem quaisquer vestígios (eu próprio procurei cuidadosamente). A jusante de Massangano, apenas existe a de Muxima. A montante, existe a de Cambambe.

As fortalezas eram apoios para a penetração no interior do território. O Rio Kwanza foi escolhido como via de comunicação mas, também, porque era necessário confirmar a existência das lendárias minas de prata desta região, na região que abarca Massangano, Dondo e Cambambe.

Neste local travou-se, em 1580, a Batalha de Massangano, na qual as forças portuguesas derrotaram as do rei Kiluange de Ngola.1 Posteriormente, em 1582, as forças portuguesas, sob o comando do Capitão Paulo Dias de Novais, foram repelidos pelos Ngola, quando tentavam penetrar na região, em busca das minas. Em 1640, as forças da rainha Nzinga atacaram o Forte de Massangano, ocasião em que as suas duas irmãs, Cambu e Fungi, foram aprisionadas, sendo esta última executada.

Na sequência da ocupação de Luanda, pelas forças da Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, em Agosto de 1641, foi em Massangano que as forças portuguesas se recolheram e onde resistiram até à reconquista, por Salvador Correia de Sá e Benevides, vindo do Brasil em Agosto de 1648, por ordem do Rei de Portugal.

Em Massangano também esteve detido o implicado na Inconfidência Mineira José Álvares Maciel, na década de 1790, sendo solto pelo Governador, para lutar pela própria sobrevivência. Seria menos uma boca para alimentar e, certamente, não resistiria, nem às doenças, nem ao confronto com animais ferozes da região. Uma variante de condenação à morte. O brasileiro tinha sido condenado por associação com o célebre Tira-Dentes, no movimento Inconfidência Mineira. Como curiosidade, refira-se que Maciel, não só sobreviveu, como se instalou no Kalumbo2, comercializando produtos agrícolas. Isto foi apreciado pelo Governador que voltou a acolhê-lo. Afinal, Maciel era técnico de metalúrgica e logo foi decidido criar as condições para que desenvolvesse a sua profissão. Para o trabalho a desenvolver por Maciel, foram encomendados equipamentos mas Maciel já não os recebeu, por ter falecido antes.

Voltando a Massangano, até meados do século XIX o presídio e a guarnição foram comandados por um capitão-mor. Alguns edifícios e as ruínas de Massangano foram classificados como Monumento Nacional pelo Decreto Provincial n° 81, de 28 de Abril de 1923. Actualmente encontram-se em poder do Estado, afectos ao Ministério da Cultura.3

Características da localidade e do Forte

O forte apresenta planta quadrada, sem baluartes nos vértices. Nos seus muros rasgam-se dez canhoneiras. Foi acedido por um túnel abobadado (destruído e desaparecido) a partir do portão de armas, pelo lado voltado para terra. Existem ruínas das edificações que eram destinadas a Casa do Comando, Quartel de Tropa e Prisão. Há 2 anos, ainda existia um canhão. A menos de 50 metros acima do leito dos dois rios, do centro administrativo de Massangano, o forte permite uma vista ampla do seu redor, o que facilitaria a observação em situação de guerra.

Massangano: um centro histórico

Foi um importante marco da resistência à penetração colonial no Reino do Ndongo. Por cerca de dez anos foi a capital de Angola e reduto defensivo, quando as tropas de Paulo Dias de Novais foram forçadas a recuar face ao ataque à cidade de Luanda pela armada holandesa.

Nos montes de Massangano, como recomendava a organização administrativa portuguesa de então, foram erguidas as infra-estruturas, hoje ruínas, em que se executavam os serviços fundamentais à gestão dos assuntos da capital.

Antes da ocupação portuguesa, documentos históricos rezam que foi um dos lugares que acolheu a Rainha do Ndongo e outros dignitários da sua corte real. A Igreja Católica, a antiga câmara municipal, a praça dos escravos, o cemitério coberto (o primeiro de Angola) e as alfândegas são as marcas visíveis desse período.

Embora ocupe uma área exígua, o centro administrativo dos colonos portugueses está devidamente delimitando pela presença dos pilares, também erigidos em pedra, que serviam para iluminação pública do lugar. Os postes de iluminação do século XVII ainda continuam na posição vertical, alguns dos quais com os restos dos candeeiros metálicos aplicados no seu cimo.

Aos restantes monumentos históricos erguidos por volta do século XVII associam-se também o túmulo do conquistador português das terras do Reino do Ndongo e fundador da cidade de Luanda, Paulo Dias de Novais, bem em frente à Igreja Nossa Senhora das Vitórias. Continua a estar referido como túmulo mas o corpo foi transladado para Luanda.

Segundo depoimentos dos locais, o primeiro presidente de Angola, António Agostinho Neto, tinha o hábito de ali meditar e descansar, numa zona banhada pelo Rio Lucala, afluente do Kwanza.

Com a abundância de água, não apenas nos dois grandes rios, mas também nas vastas lagoas, e uma vegetação verdejante, a agricultura e a pesca poderiam ser (ou já foram)  as principais actividades, o que permitiu alguma suficiência alimentar em horto-frutícolas, peixe e carne.

Há, no entanto, algumas aparentes incongruências. A lápide do forte diz que foi construído em 1604, mas o letreiro afirma que é do séc. XVI. Poderão estar ambos estão correctos porque houve uma fortificação anterior, provavelmente construída com muros de terra e estacas de madeira, que se julga datar de 1583.

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1 Já encontrei versões diferentes sobre esta batalha, acreditando que a falta de documentos tenha dado oportunidade a alguma imaginação, temperada com nacionalismos vários).

2 Kalumbo é uma pequena povoação, igualmente junto ao rio Kwanza que teve alguma importância como “entreposto” de produtos hortícolas com destino a Luanda. Actualmente, embora mantendo a zona ribeirinha sem grandes alterações, comporta uma zona urbana de grande densidade populacional – Zangos

3 Foram feitas obras de restauro na igreja mas os “chineses” não souberam preservar e a igreja ficou transformada num edifício com pintura exterior em cinzento e laranja, muito diferente do branco original. A Igreja da Muxima, a jusante de Massangano também foi restaurada por chineses e ganhou um exterior amarelo. Espero que não haja mais decisões de restauração.

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Texto da autoria de António Encarnação

 

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