O neoliberalismo é uma vertente distinta abrangida pela ideologia liberal, tendo aparecido na década de 40 do século XX, ainda que o período de maior influência desta doutrina se insira no contexto dos anos 70. A denominação é polémica, uma vez que os neoliberais reconhecem-se mais como liberais clássicos ou simplesmente liberais. Contrariamente ao que se julga precocemente, o neoliberalismo não consiste numa doutrina uniforme, o que se atribui às tensões internas próprias da corrente; pense-se na colisão entre o estilo de economia laissez faire, que se rege por uma política mínima de interferência nas operações de mercado, com a intervenção estatal nas mesmas operações de mercado, cujo princípio é regular e colocar as melhores potencialidades institucionais ao serviço de uma economia responsável.
Os primeiros indivíduos a identificarem-se como neoliberais foram os liberais alemães, como é o caso de Alexander Rustow, que usou o termo pela primeira vez em 1930 para descrever novas correntes de pensamento liberal hostis ao estatismo e ao coletivismo, formas de regulação dominantes na primeira metade do século XX, cujos ingredientes se baseariam numa nova forma de economia política com ênfase no mercado ao invés da hierarquia burocrática, e naturalmente enquadrada no Direito, ordenadora da economia. Os neoliberais alemães procuraram renovar os princípios liberais depois do impacto devastador do totalitarismo nazi na sociedade e política alemã, isto é, apelando ao primado do Estado de Direito, a uma economia de mercado competitiva, ao direito à propriedade privada, e ao mesmo tempo permitindo a atividade do Estado para garantir os mínimos sociais. Todo este conjunto de ideias cristalizou-se na ideia de uma economia social de mercado, que disponibilizou os tentáculos intelectuais para a recuperação económica da Alemanha do pós-guerra, e isto sob a tutela de Ludwig Erhard.
Depois de 1945, os neoliberais alemães tornaram-se parte de um movimento mais amplo, quer dizer, de neoliberais ocidentais, que procurou revitalizar o liberalismo que então se encontrava em retirada face à ideologia coletivista. Sob a orientação de figuras como F.A. Hayek, a sociedade Mont Pelèrin foi fundadad em 1947 na Suíça, e incluía liberais proeminentes como Ludwig von Mises, Milton Friedman, Max Hartwell, Lionel Robbins, e Karl Popper.
A asserção clássica dos princípios neoliberais começa com a publicação da obra de Hayek intitulada The Constitution of Liberty, publicada em 1960. Ao longo de inúmeras páginas são defendidas as instituições políticas e regras necessárias para uma ordem liberal, e todo este material assente na tradição do liberalismo clássico, particularmente o racionalismo crítico de Adam Smith. Hayek revelou grande astúcia em distinguir o verdadeiro liberalismo do falso liberalismo, recapturando assim o termo liberal e livrando-o da contaminação das ideias coletivistas. Os seus esforços foram fortemente criticados como um regresso a uma forma de liberalismo, o do século XIX, em descrédito. Inúmeros foram as vozes que argumentaram que esse modo de pensamento seria impossível de ser ressuscitado porque o mundo e as sociedades eram outros. Não obstante, a organização burocrática indispensável à coordenação da economia tornava irrealista o regresso ao Estado mínimo.
No entanto, por volta de 1960 e 1970, as ideias neoliberais começaram a conquistar terreno. A adoção de preceitos neoliberais básicos por agências internacionais como o FMI para conterem os problemas inerentes à estagflação revelou ser um movimento-chave. A tradução desta ideia na ideologia do senso comum dominante em países com grande peso como os EUA, a Inglaterra e a Austrália, incrementou a ascensão do neoliberalismo, ao que se acrescenta ainda a impotência do keynesianismo perante as dificuldades económicas enfrentadas pelo ocidente desde finais da década de 60, nomeadamente a erosão das condições excecionais de crescimento económico que existiram durante a década de 50. Todos estes problemas foram exacerbados pelo colapso do sistema monetário pós-guerra em 1971, a flutuação do dólar, e toda uma série de embates financeiros, como a quadruplicação do preço do óleo em 1973. A necessidade de um novo conjunto de princípios organizadores para a gerência da economia global foi correspondida pelo ideário neoliberal.
Para estar à altura das novas exigências, o neoliberalismo revitalizou (embora não todos) os princípios básicos do liberalismo clássico, expressando-os, contudo, em novas formas. O resultado foi uma forma nova e distinta de liberalismo, que atraiu intelectuais que baste, e cuja repercussão dura ainda hoje.
References:
Harvey, D. (2005) A Brief History of Neoliberalism. Oxford University Press, New York.