A 1 de Novembro de 2007 o investimento em instrumentos financeiros passou a estar sujeito a novas regras que visam reforçar a proteção dos investidores, devido à transposição para a nossa ordem jurídica da Diretiva dos Mercados de Instrumentos Financeiros (DMIF).
Como estas regras se aplicam aos 27 países da União Europeia todos os investidores europeus passaram a estar abrangidos pelos mesmos mecanismos de proteção. Assim, esta diretiva trouxe as seguintes mudanças principais: (i) classificação que os intermediários financeiros (bancos, corretoras, financeiras de corretagem, gestoras de patrimónios e consultoras para investimento) terão de fazer dos seus clientes de forma a identificar os produtos financeiros adequados ao respetivo perfil de risco; (ii) entidades que podem receber ordens de investimento, o modo como as executam e as precauções que os investidores devem tomar ao transmitir uma ordem; (iii) a informação que deve ser prestada aos investidores pelos intermediários financeiros antes, durante e após a prestação de qualquer serviço de investimento. Foram também (iv) introduzidos novos requisitos de organização e funcionamento dos mercados de valores e das entidades que prestam serviços de investimento aos investidores, com o objetivo estimular a concorrência, assegurar níveis adequados de transparência e garantir a credibilidade e regularidade do seu funcionamento.
Aspetos mais relevantes
- Atualização do elenco dos serviços e atividades de investimento e respetivos serviços auxiliares
No que respeita aos serviços e atividades de investimento, salienta-se a inclusão da consultoria para investimento nesta categoria de serviços, que deixa assim de ser entendida como serviço auxiliar. Ainda no âmbito das alterações relativas ao elenco dos serviços de investimento, refira-se também a inclusão, nesta categoria, da atividade de gestão de sistemas de negociação multilateral, cujo exercício se reserva a determinadas instituições de crédito e a sociedades financeiras de corretagem, apesar de se admitir a possibilidade de a mesma ser exercida por sociedades gestoras de mercados regulamentados ou de serem constituídas sociedades que tenham como objeto exclusivo o respetivo exercício.
- Reconhecimento de novas formas organizadas de negociação de instrumentos financeiros
Para além dos mercados regulamentados, são os sistemas de negociação multilateral e a internalização sistemática – possibilidade de os intermediários financeiros não dirigirem as ordens de clientes para um mercado regulamentado ou sistema de negociação multilateral, procedendo à sua execução contra a sua própria carteira, de forma organizada, regular e sistemática. Passa assim a ser possível a execução das ordens nos locais globalmente considerados como os melhores pelos intermediários financeiros (com melhores preços e melhor qualidade de execução – conhecido por best execution), podendo estes escolher o modo economicamente mais racional de executar as ordens recebidas dos clientes. De entre as regras de admissão e seleção de instrumentos financeiros para negociação, ressalta-se a possibilidade de valores mobiliários admitidos à negociação em mercado regulamentado poderem ser subsequentemente negociados noutros mercados regulamentados e em sistemas de negociação multilateral sem o consentimento do emitente, sem que daí resultem obrigações de prestação de informação adicional por parte do emitente. Outro aspeto inovador da DMIF é o alargamento das entidades que, para além dos intermediários financeiros, podem ser membros dos sistemas de negociação (mercados regulamentados e sistemas de negociação multilateral).
- Mercados Regulamentados
Os mercados regulamentados são definidos como sistemas que, tendo sido autorizados como tal por qualquer Estado-Membro da União Europeia, são multilaterais, geridos por uma entidade gestora de mercado e funcionam regularmente a fim de possibilitar o encontro, dentro do próprio sistema e de acordo com regras não discricionárias, de interesses de compra e venda de instrumentos financeiros, com vista à celebração de contratos sobre tais instrumentos. Além dos critérios de acesso ao mercado e à qualidade de membro, as regras de mercado regulamentado devem especificar os deveres, aplicáveis aos seus membros, em particular os decorrentes da constituição e gestão do mercado regulamentado, das normas especialmente aplicáveis aos colaboradores dos membros e das normas e procedimentos para a compensação e liquidação das transações ali concluídas, bem como mecanismos de controlo do cumprimento daquelas regras e das transações efetuadas através do seu sistema.
- Deveres de Informação Pós-Negociação
Quer a ordem tenha sido executada num mercado regulamentado ou num sistema de negociação multilateral, quer tenha ainda sido executada por intermediário financeiro fora destes sistemas, é exigida a
divulgação de um nível semelhante de informação. A concreta informação cuja divulgação é exigida, os prazos, condições e meios de divulgação da mesma, bem como as condições de dispensa ou deferimento do cumprimento do dever de divulgação referidos, encontram-se especificados no Regulamento.
- Conflitos de interesses / Incentivos
A DMIF procedeu a um aprofundamento da já existente estrutura normativa. Nesses termos, e em especial, torna-se obrigatória a adoção, por escrito, de uma política destinada a identificar possíveis conflitos de interesses e a eliminar ou a reduzir o risco da sua ocorrência, dos quais o cliente deve ser informado, bem como das circunstâncias em que este possa ser potencialmente prejudicado por aqueles. Entre os vários requisitos que devem constar da política interna de prevenção, gestão e comunicação de conflitos de interesse, a lei alerta designadamente para a necessidade da previsão de procedimentos que garantam a independência dos colaboradores do intermediário financeiro numa situação de conflito de interesses em que aqueles intervenham.
- Deveres de informação
Neste ponto, importa a distinção entre investidores qualificados e investidores não qualificados, visto ser conferida uma maior proteção a estes últimos, por serem impostos deveres de informação acrescidos quando sejam prestados serviços a este tipo de investidores não qualificados.
Nestes termos, com vista a assegurar que o investidor tome uma decisão esclarecida e fundamentada, deve o intermediário financeiro prestar-lhe todas as informações relevantes, com antecedência suficiente à vinculação a qualquer contrato de intermediação financeira, sendo que essa informação deve ser verdadeira, clara, atual, objetiva e lícita.
- Avaliação do carácter adequado
Na tentativa de proporcionar ao cliente oportunidades de investimento que melhor se adaptem ao seu perfil, é importante que o intermediário financeiro conheça ao pormenor quer os serviços que proporciona, quer os conhecimentos e a experiência dos clientes com que lida, visando adequar estes àqueles da melhor forma possível (princípio do know your customer). Para o efeito, deve o intermediário financeiro solicitar ao cliente toda a informação relativa aos seus conhecimentos e experiência em matéria de investimento de forma a poder avaliar se o cliente compreende os riscos envolvidos nas operações projetadas. Esta informação deve incluir, no mínimo, os tipos de serviços, operações e instrumentos financeiros com que o cliente está familiarizado, a natureza, o volume e a frequência das operações do cliente em instrumentos financeiros, bem como o período em que foram realizadas e, por último, o nível de habilitações, a sua profissão ou anterior profissão, no caso de ser relevante para o efeito. Esta análise da adequação poderá ser feita, por exemplo, através de questionários dirigidos aos investidores (suitability tests).
- Classificação de clientes
De acordo com a análise efetuada aos clientes, é possível, posteriormente, ao intermediário financeiro realizar uma categorização dos clientes em função da sua experiência e conhecimentos nos investimentos em causa. Sendo também esta uma novidade do novo enquadramento jurídico pelo qual se rege agora a atividade dos intermediários financeiros, essa categorização divide-se em três classificações possíveis: investidor não qualificado, investidor qualificado e contraparte elegível. O nível de proteção destas três categorias é, respetivamente, descendente, o que significará uma maior proteção para o investidor não qualificado e uma proteção mínima relativamente às contrapartes elegíveis. Como regra geral, o intermediário financeiro pode livremente conferir graus que apliquem uma maior proteção a qualquer um dos seus clientes (por exemplo, passar a tratar um investidor qualificado como um investidor não qualificado).
- Melhor transmissão / execução
No que respeita ao regime da execução de ordens, os intermediários financeiros devem adotar uma política de execução de ordens, impendendo sobre eles o ónus de demonstrar que as ordens de um determinado investidor foram executadas de acordo com essa política. O desenvolvimento deste princípio faz recair sobre os intermediários financeiros, independentemente do instrumento financeiro em causa, a obrigação de adotar as medidas necessárias para proporcionar ao cliente o melhor resultado possível aquando da execução das respetivas ordens e abrange a execução de decisões de negociar por conta de clientes, estipulando, justificadamente, para cada tipo de instrumentos financeiros, as estruturas de negociação que permitam obter, de uma forma reiterada, o melhor resultado possível para o cliente.