As primeiras experiências registadas sobre as propriedades físicas dos lípidos remontam ao ano de 1774 pelo estadista e cientista americano Benjamin Franklin. Este ao investigar a ação bem conhecida (pelo menos entre os marinheiros) do óleo acalmar as ondas do mar, Franklin escreveu: “Por fim, estar em Clapham (em Londres), onde existe um grande lago, que eu ao observá-lo num dia bastante duro e com vento, fui buscar uma bureta com óleo (provavelmente azeite) e deitei um pouco na água. Consegui observar que ele se espalhava com bastante rapidez e de forma surpreendente sobre a superfície… Então fui para a zona do barlavento, onde as ondas têm origem, e lá o óleo, não mais do que uma colher de chá, produziu uma calma instantânea ao longo do espaço, o óleo espalhou-se surpreendentemente e estendeu-se gradualmente até alcançar o sotavento, fazendo com que um quarto da lagoa ficasse tão suave e lisa como um espelho”. Esta informação foi suficiente para permitir o cálculo da espessura da camada de óleo (embora não exista nenhuma indicação de que Franklin tenha efetuado este cálculo). Todavia, sabemos agora que o óleo forma uma camada monomolecular sobre a superfície da água em que as “cabeças” polares das moléculas de óleo que são de carácter anfifílico estão imersas na água e as suas “caudas” de características hidrofóbicas estão fora de água. Assim sendo, o efeito calmante do óleo sobre a água é uma consequência da redução da tensão superficial da água. Ainda assim, um filme de superfície oleosa tem uma fraca coesão intermolecular (devido aos hidrocarbonetos), em vez de fortes atrações intermoleculares da água responsáveis pela grande tensão superficial. Contudo, a agregação dos lípidos podem dar origem a micelas, bicamadas lipídicas (base estrutural das membranas biológicas) e lipossomas.
- Micelas e Bicamadas lipídicas: Em soluções aquosas, as moléculas anfifilicas, tais como os detergentes, formam agregados globulares designados por micelas (os grupos de hidrocarbonetos estão fora do contacto com a água). Este rearranjo molecular elimina os contactos desfavoráveis entre a água e as “caudas” hidrofóbicas permitindo ainda a solvatação dos grupos de “cabeça” polares. A formação das micelas é um processo de cooperação onde apenas um conjunto de algumas moléculas anfifilicas podem não proteger as “caudas” do contacto com a água. Consequentemente, soluções aquosas diluídas de compostos anfifilicos não formam micelas até que a sua concentração ultrapasse uma determinada concentração micelar crítica (cmc). Acima da cmc, quase toda a agregação de moléculas anfifilicas vão dar origem a micelas, sendo que a cmc depende diretamente da identidade da molécula anfifilica e das condições da solução. Para moléculas anfifilicas com “caudas” individuais relativamente pequenas, tais como o ião de sulfato de dodecilo CH3(CH2)11OSO3ˉ a cmc é de aproximadamente 1 mM, por outro lado para os lípidos biológicos (a maioria dos quais com duas grandes “caudas” hidrofóbicas) é geralmente superior a 10ˉ6 M. Porém, os lípidos de “cauda” única tendem a formar micelas, enquanto os glicerofosfolípidos e os esfingolípidos tendem a formar as bicamadas lipídicas.
- Lipossomas: são uma suspensão de fosfolípidos em água que dão origem a vesículas multilamelares que possuem um rearranjo tipo “cebola” das bicamadas lipídicas. Assim, os ultra-sons (agitação por vibrações ultra-sónicas) são usados para rearranjar estas estruturas e originar assim lipossomas (fechado, auto-vedante, vesículas cheias com solventes que são delimitadas por apenas uma única bicamada). Estes apresentam geralmente diâmetros de várias centenas de Angstroms. Uma vez formados, os lipossomas são bastante estáveis e podem ser separados a partir da solução em que residem por diálise, pela técnica cromatográfica de filtração em gel ou por centrifugação. Todavia, os lipossomas com diferentes ambientes internos e externos podem ser facilmente preparados, sendo que as membranas biológicas consistem em bicamadas lipídicas com as quais as proteínas se associam. Contudo, os lipossomas que são constituídos por lípidos sintéticos e/ou lípidos extraídos de fontes biológicas (como por exemplo, lecitina de gema de ovo) têm sido extensivamente estudados como modelos para as membranas biológicas.
Outros assuntos relacionados
References:
- Tanford, C., The Hydrophobic Effect: Formation of Micelles and Biological Membranes (2nd ed.), Wiley–Interscience (1980).
- Lasic, D.D., Novel applications of liposomes, Trends Biotech. 16, 307–321 (1998).