Evolução da Terapia Familiar
A terapia familiar teve origem nos Estados Unidos no final dos anos 50, num contexto de mudança de paradigmas (Magagnin, 1995).
Broderick e Schrader (1981, citados por Sampaio e Gameiro, 2002) consideram que a terapia familiar se estruturou como resposta a necessidades sociais, como o aconselhamento familiar, os centros comunitários e de saúde mental infantil, os modelos de psicoterapia breve.
A partir dos anos 60 a terapia familiar ganhou terreno como modelo de investigação e de intervenção no campo da saúde mental. É nesta altura que a terapia familiar aparece em Portugal com o pressuposto de integrar o doente na comunidade, participando a família nesse tratamento (Sampaio & Gameiro, 2002).
Terapia Familiar
A terapia familiar baseia-se no facto de que o homem não é um ser isolado, mas interage num grupo. A família passa então, a ser considerada como um sistema, onde todos os componentes são considerados em igualdade para o efeito terapêutico. Assim, a mudança de objectivo terapêutico, a passagem do tratamento individual ao familiar, introduz uma nova variável que muda fundamentalmente a forma de pensar a saúde/doença mental enquanto disfunção interactiva do sistema familiar, não significando isto que a terapia individual tivesse perdido a sua validade (Magagnin, 1995).
A abordagem dos conceitos de família como sistema, a sua homeostase e a comunicação como ingrediente da interacção, trazem uma nova ideia de que, no sistema familiar, não são as pessoas que adoecem, mas os vínculos, a ligação dos elementos familiares (Magagnin, 1995).
Destacam-se então, duas áreas fundamentais:
– Teoria Geral dos Sistemas que nos diz que a terapia familiar retira e aplica no seu âmbito específico princípios formulados para os sistemas em geral: todos os sistemas sociais e humanos são abertos e hierarquizados, ou seja, estão inseridos num meio com o qual decorrem trocas permanentes (supra-sistema) sendo integrados por sub-totalidades autónomas (subsistema), podendo funcionar como sistemas mais vastos ou como sistemas mais restritos (Relvas, 2003).
– Teoria Ecossistemática da Comunicação (desenvolvida por Bateson e pelo grupo de investigadores de Palo Alto, 1980) cujo objectivo concreto dos seus primeiros estudos é aplicar ao estudo da comunicação os princípios cibernéticos e sistémicos, a partir dos quais se afirmam e se aplicam noções de causalidade circular, paradoxos comunicacionais, meta-comunicação, pontuação (ordenação) e comunicação digital analógica. É a partir da Escola de Palo Alto que surge a terapia familiar estratégica breve (Relvas, 2003).
A terapia familiar teve uma expansão rápida e difundiu-se por toda a Europa, sofrendo forte influência da Psicanálise. Salvador Minuchin vai desenvolver as mais importantes escolas de intervenção terapêutica: a terapia familiar estrutural. No seguimento, Mara Selvini Palazzoli cria o núcleo da famosa Escola de Milão, aplicando a perspectiva comunicacional estratégica (Relvas, 2003).
O primeiro relato sistémico de psicoterapia familiar baseava-se em conceitos psicanalíticos tradicionais. Sucederam-se outras abordagens à terapia familiar, umas analiticamente orientadas, outras incorporando novos modelos. São exemplos o importante trabalho de Haley (1963,1971), Minuchin (1974), Minuchin e Fishman (1981) e a abordagem sistémica de Milão (Bloch, 1999).
Segundo Sampaio e Gameiro (2002) uma família que procura a terapia é um grupo familiar que de algum modo bloqueou o seu próprio desenvolvimento, ou seja, que não consegue, por si próprio criar alternativas que lhe possam possibilitar ou dar respostas às dificuldades do seu quotidiano. Aqui, o terapeuta familiar funciona como um agente que através da sua acção vai provocar um desequilíbrio transitório na vida familiar, de modo a que o grupo família possa criar uma nova estrutura de funcionamento e um novo modelo racional.
Neste trabalho o terapeuta deve ter em conta não só a função principal da família, que é a de fornecer meios de subsistência aos seus elementos, como ao mesmo tempo deve fazer face às tarefas de desenvolvimento e também a outras zonas de instabilidade que possam futuramente aparecer (como separações, doenças, crises económicas…). O terapeuta deve trabalhar por um lado o eixo vertical ou transgeracional, onde deve trabalhar essencialmente os mitos, papéis e funções características da família em terapia, bem como os seus níveis de autonomia e diferenciação de cada membro da família em relação à família de origem. Por outro lado deve trabalhar também o eixo horizontal, ou eixo do aqui e a gora que inclui o estudo dos padrões interacionais da família em terapia bem como o modo como o grupo família lida com as dificuldades da vida (Sampaio & Gameiro, 2002).
Quanto à avaliação, Bentovim (1999), refere que ao avaliar se uma família é adequada para um tratamento como grupo, o terapeuta irá encontrar vantagens em considerar três enquadramentos: o ciclo de vida da família; o modelo transgeracional da vida familiar e o funcionamento da família no aqui e agora. Contudo, e como menciona Barker (2000), não se pode descurar que a avaliação das famílias tem de ser sistemática e flexível.
Seja qual for o modelo de funcionamento familiar empregue, o principal foco de atenção está no sistema familiar, embora o terapeuta não deva ignorar as características dos elementos individuais da família. Poderá ser útil fazer uma abordagem triádica à entrevista familiar, pois no centro daquilo que se apresenta como disfunção familiar mais alargado está, por vezes um problema conjugal o que implica pensar em grupos de três indivíduos, ou grupos de indivíduos e a forma como interagem. Também deverá ser considerada a fase de evolução da família e se esta sente dificuldade na transição de uma fase para outra. A avaliação leva a uma formulação de diagnóstico, dá-se o feedback à família e explica-se o tratamento recomendado.
Em alguns casos, pode também ser necessário recorrer a outros técnicos externos e pode ser desejável a sua implicação no espaço de tratamento.
Bibliografia:
Araújo, M. (2001). O impacto do divórcio parental sobre os filhos: papel dos avós neste processo. Revista de psicologia da Unicap, 1 (I), 11-27.
Barker, P. (2000). Fundamentos da terapia familiar. Lisboa: Climepsi Editores.
Bentovim, A. (1999). Terapia Familiar. In: Bloch, S. Uma introdução às psicoterapias, Lisboa, Climepsi Editores, pp.245-265.
Berger, M. (2003). A criança e o sofrimento da separação. Lisboa: Climepsi Editores.
Bloch, S. (1999). Uma introdução às psicoterapias. Lisboa: Climepsi Editores.
Costa, M. E. (1994). Divórcio, monoparentalidade e recasamento: Intervenção psicológica em transições familiares. Porto: Edições Asa.
Magagnin, C. (1995). Terapia familiar sistémica. Aletheia, (1), 27-31.
Osório, L. C. (2002). Terapia de famílias: Novas tendências. Porto Alegre: Artmed Editora.
Sampaio, D., Gameiro, J. (2002). Terapia Familiar (5.ºed.). Porto: Edições Afrontamento.
Sani, A. (2004). O discurso de crianças expostas à violência interparental: Estudo qualitativo. Psychologica, 36,109-130.
Relvas, A. P. (2004). O ciclo vital da família: Perspectiva sistémica (3.ºed.). Porto: Edições Afrontamento.
Relvas, A.P. (2003). Por detrás do Espelho. Da teoria à Terapia com a Família (2.ºed.). Coimbra: Edições Quarteto.