Conceito de Perturbação Dependente
A perturbação dependente é uma perturbação da personalidade (Eixo II, no Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais) que integra o grupo o Grupo C, referente às organizações de personalidade caracterizadas pela ansiedade e pelo medo.
Indivíduos com perturbação dependente apresentam comportamentos de submissão em diferentes contextos da sua vida (e.g. familiar, laboral, círculo de amizades), que se expressam na necessidade desproporcional de serem cuidados, na dificuldade em tomar iniciativa e decisões sem o auxílio de outros, bem como na passividade face a opiniões com as quais discordam. Esta atitude encontra-se relacionada com o medo intenso da crítica e do abandono, o qual resulta em sentimentos de desespero e desamparo. O desamparo é também experienciado no contexto de um relacionamento quando se encontram sozinhos, procurando assim reduzir ou eliminar o seu espaço pessoal.
Conceptualização
No que respeita ao desenvolvimento da personalidade, a organização dependente remete para a ausência de necessidade de cuidar de si próprio e a progressiva construção do self como frágil e inadequado. Esta percepção de si mesmo é desencadeada pela vivência e aprendizagem em contextos excessivamente protetores, nos quais as necessidades do indivíduo são suprimidas em absoluto ao longo do seu desenvolvimento, sem cedência deste controlo. Neste sentido, a criança tornada adulto perspectiva-se na realidade como um ser imaturo psicologicamente, cujo bem-estar depende do cuidado e responsabilização dos outros em grande parte das decisões da sua vida.
Os relacionamentos interpessoais configuram frequentemente a dinâmica de submissão-poder, mantida pela necessidade de aprovação e cuidado. A amabilidade e recetividade do indivíduo dependente contribuem assim para a proximidade relacional, reforçada pela sua atitude solícita aquando de situações nas quais sinta que é capaz de agradar o outro (e.g. realizando por este pequenas tarefas desagradáveis). Nesta dinâmica, o outro na relação apresenta poder sobre o indivíduo dependente, sendo esta desigualdade percebida como tranquilizadora, na medida em que aprendeu a ceder o controlo de si, das suas responsabilidades e resposta a desafios, por oposição à aprendizagem do autocuidado e autonomia.
Avaliação diferencial e comorbilidade
Pelas características da sua personalidade, apresentam elevada vulnerabilidade no desenvolvimento de perturbações de ansiedade. Sendo o medo uma emoção constante, associada à crença de inadequação e fragilidade, são frequentes os pensamentos catastróficos relativos ao abandono, ao estar sozinho, assim como preocupações excessivas relativas à opinião dos outros sobre si. A percepção frágil de autoeficácia e autoestima, por sua vez, proporcionam a desesperança e a dificuldade de pensar alternativamente e resolver problemas. No âmbito deste quadro cognitivo, é frequente o desenvolvimento de perturbações de pânico com agorafobia, bem como de perturbações depressivas, nas quais o desamparo e desesperança são centrais, nomeadamente em situações de stress, como seja a perda de um relacionamento significativo.
No âmbito das perturbações da personalidade, revela-se útil ainda o diagnóstico diferencial face a outras perturbações, pela semelhança de algumas características. A perturbação Evitante, por exemplo, é também pautada pela sensibilidade acrescida à crítica, à avaliação/opinião dos outros, bem como pela percepção diminuída de autoeficácia. Contudo, contrariamente ao que se verifica em indivíduos com perturbação dependente, indivíduos com organização evitante tendem a evitar, justamente, os relacionamentos interpessoais pelo medo de serem julgados. De um modo geral, na organização dependente verifica-se ausência de confiança em si mesmo a par de confiança extrema nos outros, enquanto na organização evitante a ausência de confiança é experienciada face a si, mas também face aos outros.
Palavras-chave: perturbação dependente da personalidade; perturbação da personalidade; submissão; ciclo interpessoal disfuncional
References:
Millon, T., Grossman, S., Millon, C., Meagher, S., & Ramnath, R. (2004). Personality Disorders in Modern Life. New Jersey: John Wiley & Sons, Inc.
Rodrigues, V., & Gonçalves, L. (2009). Patologia da Personalidade. Teoria, clínica e terapêutica. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.